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Editorial: o que o 'Cheek To Cheek' mudou na vida de Tony Bennett, de Lady Gaga, na nossa e na sua

Quando Lady Gaga se uniu a Tony Bennett em 2011 com a regravação do clássico "The Lady Is A Tramp" (música mais adequada não houve) para o álbum "Duets II" do cantor, ninguém imaginava o impacto que o dueto teria. O que seria apenas um featuring se tornou a semente para algo muito maior que viria a germinar em 2014.



Eis que surge o "Cheek To Cheek". O álbum colaborativo da lenda do jazz com a "Picasso do mundo do entretenimento" (nas palavras de Bennett) é composto por regravações retiradas do "Great American Songbook": uma espécie de catálogo que engloba as composições mais famosas da cultura popular dos Estados Unidos no século XX, sendo a maioria escritas por grupo de compositores para Broadway e Hollywood entre os anos 1920 e 1960, época em que Bennett atuou pesadamente - é absmante ver que ele tem 88 anos (60 a mais que Gaga) e que o "Cheek To Cheek" é seu 57º álbum, repetindo, QUINQUAGÉSIMO SÉTIMO ÁLBUM. Fora as coletâneas e afins, o que faz o número passar de 70.

Aventurar-se pelo jazz é, talvez, a jogada artística mais hiperbólica até hoje de Lady Gaga. A diferença entre o mundo pop e o jazz é enorme: enquanto o primeiro é cultura de massa, com números estratosféricos e visibilidade gigantesca, o jazz cada vez mais se torna cultura elitizada, com consumidores seletos e restritos. É só se perguntar: você já viu alguma música de jazz no top 10 da Billboard Hot 100 ultimamente, a maior parada de músicas do mundo? Isso há décadas era muito mais comum - o jazz era cultura popular. Aqui poderíamos entrar na discussão de "jazz é música de verdade" em detrimento do pop, o que é um erro, pois segregar cultura é algo sem nexo, já que não há cultura melhor ou pior, apenas culturas diferentes.



Ao mesmo tempo que a jornada pelo jazz dá amadurecimento artístico à mãe dos monstros, é um argumento certeiro para os seus haters de plantão, principalmente por vir logo após o sepultamento do seu último álbum pop, o "ARTPOP", que na boca dos maus intencionados foi um "fracasso", com o "Cheek To Cheek" sendo uma jogada da cantora de "Applause" para se manter "na mídia". O "ARTPOP" já vendeu mais de duas milhões de cópias mesmo com a divulgação capenga que teve e o "Cheek To Cheek" está planejado há tempos (foi confirmado em janeiro de 2013, para ser mais exato), ou você acha que os dois preparam tudo do começo do ano pra cá?

Tony Bennett já tem - há décadas - seu nome mais que consolidado no mercado. Ele é uma lenda: com 57 álbuns ele já conseguiu nada menos de 17 Grammys e 2 Emmys. Fora seu legado musical, algo descomunal. Ao unir-se com ele, Gaga, que também já é uma artista concreta, agrega valor à sua carreira que poucos sonham em possuir. É fato que Bennett adora descobrir e explorar nomes em featurings excepcionais (Christina Aguilera, Amy Winehouse, Aretha Franklin e Mariah Carey são alguns deles), porém uma coisa é fazer uma parceria, outra é fazer um álbum completo (com direito a turnê). Gaga já havia demonstrado interesse pelo gênero, como ela repetiu - insistentemente - que tem familiaridade desde os 13 anos rs. Um exemplo disso é a versão em jazz de "Yoü And I", que até clipe ganhou.



E é inegável: a voz da cantora é um deleite perfeito para o gênero. É só vê-la performando o hino da Cher "Bang Bang (My Baby Shot Me Down)" para notarmos a força vocal que ela tem com o ritmo. Além disso, há uma questão primordial a ser levantada aqui: com o jazz, Gaga tem liberdade artística (e pessoal) para fazer o que quiser. O mundo pop é cruel, exigente e sempre demanda o máximo do artista. Caso o mesmo falhe, ele é rechaçado, excluído, repelido, como vimos com a própria com seu último álbum. Esse efeito é algo terrível para qualquer pessoa, chegando a desgastar até acabar com o artista. Com o jazz isso não existe.



Nós optamos fazer um editorial do álbum em vez de uma resenha por um motivo simplérrimo: somos um blog de música pop. Jazz é, inevitavelmente, um estilo que foge do nosso domínio, então como julgar algo que você não tem cacique para falar sobre? Deixa esse papel para os críticos íntimos do ritmo. Mas nós podemos dar nossa opinião mesmo leiga, não? O "Cheek To Cheek" é um álbum interessante e estranhamente coeso, tanto no seu conjunto musical quanto na voz dos seus intérpretes, com duas gerações de distância entre um e outro. Tony entregou todo um legado acumulado nos seus longuíssimos anos de estrada à Gaga, que entregou a ele o frescor da juventude, a audácia de sua personalidade e, claro, a visibilidade que a maior artista pop do mundo (segundo o Guinness Book) possui - prova disso é que o álbum estreou em #1 na Billboard 200, feito hercúleo nos dias de hoje.

E no mundo, o que mudou? Com a popularidade de Gaga, os clássicos musicais, por vezes esquecidos pela enxurrada de música que a era digital proporcionou, foi introduzida às novas gerações, o que é ótimo, mesmo que você não goste do estilo, não seja fã e nem tenha no seu player (e você não deve se culpar caso não goste). Só em conhecer, em se aproximar daquela cultura já é algo que edifica tanto você quanto a própria cultura em questão, que repassada de geração em geração vira imortal. Sim, nós sentimos muita falta de Gaga e suas parafernálias pop, performances estrondosas e aparições causadoras (não demore tanto a voltar, viu moça?), mas nós não só podemos como devemos dar os parabéns a Tony Bennett & Lady Gaga pelo belo trabalho com o "Cheek To Cheek". Cheers!



Caso você não tenha ouvido o álbum, temos stream do "Cheek To Cheek" completinho - é só clicar aqui.
disqus, portalitpop-1

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