Atualmente, Bruno Mars é, sem sombra de dúvidas, um dos grandes nomes (senão "O") do pop masculino, emplacando hits atrás de hits nas rádios e paradas do mundo todo. Enquanto seu segundo álbum, "Unorthodox Jukebox" (2012) serviu para consolidá-lo ainda mais no mercado, seu debut "Doo-Wops & Hooligans" (2010) foi o grande responsável por fixar seu nome em nossos radares, após parcerias de sucesso com B.o.B e Travie McCoy, além de ter escrito "Fuck You" para Cee-Lo Gren, e lançar um EP aclamado ("It's Better If You Don't Understand") em 2010.
Aparentemente simples, flertando com vários estilos, mas essencialmente R&B e o pop, e inteiramente produzido/composto pelos Smeezingtons (trio comandado pelo cantor, com Philip Lawrence e Ari Levine), seu material de estreia foi um sucesso estrondoso. Só para terem ideia, ao final do ano de 2011, três dos quatro singles lançados por Mars figuraram entre os 10 mais ouvidos do ano. Respectivamente, "Just the Way You Are" (#2), "Grenade" (#1) e "The Lazy Song" (#4). Compositor hábil, além de uma das vozes mais radiofônicas do mercado nos últimos tempos, o álbum nos possibilitou não apenas um novo ídolo para amar — num mercado que desde o hiato de Justin Timberlake em 2007, carecia de bons nomes masculinos —, como também nos deu o primeiro contato com o novo "Midas" da música mundial.
Partindo disso, chegamos à nossa primeira Throwback Review de um álbum masculino, com Bruno Mars e seu fascinante debut, "Doo-Wops & Hooligans", que tem como puro e simples conceito, transmitir canções que meninas possam se identificar (o lado "doo-wop"), mas também aquelas feitas para os caras (o lado dos "hooligans"). Pode até parecer um conceito inocente à primeira vista, mas quando olhamos pra ele como um todo, soa muito mais revelador que sua base genérica pressupõe.
O álbum começa com seu maior sucesso comercial: o hino dilacerador de corações e sombrio, "Grenade". Que já começa lidando com seu primeiro alvo potencial: o coração feminino, ao abordar o complicadíssimo tema de amor não-correspondido. Nesta canção, Bruno nos dá seu lado fofo , fazendo com que todos nós queiramos abraçá-lo e compartilhemos de sua dor, ao nos contar, cheio de sinceridade, sobre uma relação desgastada, em que uma das partes se esforça ao extremo para reavê-la... "Eu pegaria uma granada por você. Jogaria minha mão numa guilhotina por você. Eu pularia na frente de um trem por você. Você sabe que eu faria qualquer coisa por você". Enquanto a "mulher louca, mulher má" não dá a mínima: "Eu passaria por toda essa dor. Levaria uma bala no meio do meu cérebro. Sim, eu morreria por você, baby. Mas você não vai fazer o mesmo. Não não não não". Essa faixa, que foi seu segundo single #1 nas paradas, é cercada de tambores tribais, que vagarosamente constroem a dinâmica ao seu redor, enquanto a mágoa escorre de sua boca, ao longo de toda letra, saindo como vítima de um coração partido (quem nunca, né?), e não só serve para mostrar suas ótimas habilidades vocais, mas também parte de seu ótimo poder como compositor, nos fazendo querer ouvi-la mais e mais. ARRASADORA!
Seguindo o prometido na parte de "Doo-Wops", temos no lead single do material e primeiro trabalho solo de Bruno para o grande público, "Just the Way You Are", outro belo exemplo. A faixa, que é uma ode à relação e ao comportamento feminino, vem cheia de versos fofos, como "Quando eu vejo o seu rosto, não há nada que eu mudaria. Pois você é incrível exatamente como você é. E quando você sorri, o mundo inteiro para e fica olhando por um tempo. Pois, garota, você é incrível exatamente como você é". Certa vez, o cantor afirmara que a faixa expressa sua visão sobre como os homens devem se comportar quando estão amando. E ninguém pode dizer que não foi cumprido, não é mesmo? Somando-se a isso, ainda temos uma produção radiofônica e um refrão extremamente catchy, além de um clipe foférrimo, que compactuaram para que essa fosse um dos maiores hits do ano. E merecidamente!
Saindo um pouco da fofura e densidade de um coração partido, vemos Mars colocar um pouco mais de fogo na relação durante a terceira faixa, que também é a primeira "Hooligan" (embora fofa), nos dando um surpreendente e sensualíssimo relato, cheio de falsetes e metáforas, a respeito de uma primeira vez ideal para um casal, sob a ótima masculina: "Apenas acompanhe, acompanhe, acompanhe. E eu irei bem devagar, bem devagar. É nossa primeira vez [...] Vou te tratar como uma princesa, garota, você é tão deliciosa. Como um sorvete num dia de verão, vou te comer antes que você derreta". Há duas versões diferentes dessa faixa. Uma com um arranjo mais voltado ao reggae beat (usada aqui) e a outra mais acústica, que é minha preferida, porque a deixa ainda mais sensual, mas é uma versão mais "rara".
O maior mérito de Bruno, entre tantos, é não se limitar. E aqui temos uma boa prova disso. Cheio de influências, mas ciente de quem ele é artisticamente, o cantor se permite a um flerte com um pop rock agitadinho. Apesar da letra e da produção em si, não serem seu melhor, é repleto de guitarras leves e bateria incorporadas, onde ele canta, de novo cheio de metáforas, sobre um amor impactante e sensual em que ele é irresistível, com direito a piadinha fálica infame hahaha: "Bem, deixe-me pensar, deixe-me pensar. Ah, o que devo fazer? Tantas coelhinhas ansiosas que eu gostaria de perseguir. Agora elas estão comendo na palma da minha mão. Há apenas uma cenoura e todas elas têm que compartilhar". UI!
"Hoje eu não estou com vontade de fazer nada. Só quero ficar deitado na cama. Não quero atender o telefone. Então deixe o recado na secretária eletrônica. Pois juro que hoje eu não quero fazer nada", assim Bruno Mars abre "The Lazy Song", o hino inteligentíssimo da preguiça masculina. Mais uma faixa simples do álbum, ela praticamente se apoia ao longo de 3:29 minutos em dois instrumentos, bateria e violão, e na constância maravilhosa de sua letra brilhante, assim como de seu videoclipe tosco, mas viral. Outro grande hit do álbum.
Depois de uma relação infernal, uma ode às mulheres, abordar a primeira vez de um casal, uma dose de cafajestagem e a eterna preguiça, Bruno traz o tema "casamento" à tona na sexta faixa. "Marry You" é um midtempo gracioso e apaixonado feito sob medida para as meninas, ao som de piano, sinos e bateria, sobre a saga de um pedido de casamento aos moldes de Las Vegas, cheio de juras de amor e doses de loucura: "É uma noite linda. Estamos à procura de algo idiota para fazer. Ei amor, eu acho que quero me casar com você".
Faixa favorita entre vários fãs do cantor, "Talking to the Moon", de fato, é brilhantemente simples em sua produção (temos apenas piano e bateria), mas tem como principal mérito, passar todo seu cenário denso e repleto de camadas de um jeito inigualável a qualquer outra do material. Tal como acontece com a maioria das outras músicas, ela foi preparada para as rádios. Sincera, suave e com Mars vulnerável, cantando sobre um amor recém-perdido: "Conversando com a lua tentando chegar até você, na esperança de que você esteja do outro lado, falando para mim também. Ou eu sou um tolo? Que se senta sozinho, conversando com a lua". Mais um deleite vocal e faixa mais famosa entre os não-fãs brasileiros, por ter sido trilha sonora de uma novela das 20h </3
Quarto single do material, "Liquor Store Blues" mostra o quão versátil Mars conseguiu ser em sua estreia. Flertou com pop, pop rock, R&B, folk e agora parte para o reggae. E faz isso com ninguém menos que Damian Marley, filho do icônico Bob Marley. Nesta canção, ele apenas quer curar suas mágoas amorosas enchendo a cara num bar: "Vou tomar uma dose pela minha dor. Uma tragada pela minha mágoa. Fico zoado hoje. Eu estarei bem amanhã".
É uma carismática faixa sobre amizade, que também aposta em sua simplicidade, com arranjo vocal e produção bem ao clima de um lual, deixando-a muito aconchegante em mais um belo registro vocal de Mars. É como se estivéssemos sentados numa praia, enquanto a brisa fresca bate em nosso rosto numa tarde de verão, enquanto o vemos cantar delicadamente à nossa frente "Você sempre terá o meu ombro quando você chorar. Eu nunca vou te deixar, nunca vou dizer adeus. Você pode contar comigo como 1 2 3, eu estarei lá. E sei que quando eu precisar, posso contar com você como quatro, três, dois. E você estará lá. Porque é isso que os amigos devem fazer".
Encerrando a versão padrão, temos a maravilhosa "The Other Side". A primeira vez que tive contato com ela foi no EP lançado por Bruno em meio às suas parcerias com B.o.B e Travie McCoy no início do ano de 2010, e ela já soava diferente e com muito potencial em relação às demais. É até engraçado que ela tenha entrado na tracklist final, porque é bem contrastante (embora se encaixe no lado "Hooligans" do álbum) com o resto do material, e mostra uma direção diferente, que confirmaríamos dois anos depois no "Unorthodox Jukebox", que Bruno não era apenas um romântico inveterado.
Encerrando o material, temos outra faixa que pertenceu ao EP. "Somewhere in Brooklyn" é essencialmente pop e cativante, apesar de sua produção ser uma das mais simples no contexto do material. Nela, Bruno canta apenas sobre um romance à primeira vista, enquanto esperava numa parada de trem, sem saber se a verá de novo: "Ela estava coberta de couro e ouro. Vinte e um anos de idade. Eu perdi ela no frio. É injusto, ela está lá fora. Em algum lugar, em algum lugar, em algum lugar do Brooklyn".
Compositor hábil e muito inteligente, em sua estreia, Bruno Mars tinha uma única intensão baseada numa equação perfeita: "seduzir as garotas" + "obter o respeito dos caras e que eles o escutassem com suas namoradas" = "o sucesso". Brincadeiras à parte, porém, seu álbum é tão feito sob medida, a partir de sua estrutura musical simples, mas que consegue transmitir cada sentimento de forma intensa e sincera quando ouvimos, que nos deu de graça um novo "Midas" no meio musical, que sabe agradar público e crítica com seus trabalhos e o melhor de tudo: sem "se vender". O sucesso dele se deu a partir do seu genuíno talento. E são artistas assim que devemos aplaudir. E nisso, Bruno acabou fazendo da simplicidade eficaz de "Doo-Wops & Hooligans", uma máquina de hits cirúrgicos para o início de sua consagração mundial. Não à toa, foi indicado ao Grammy de "Álbum do Ano" em 2012, e possibilitou ao cantor, que vencesse seu primeiro gramofone dourado na categoria de "Melhor Performance Pop Masculina", por "Just the Way You Are", um ano antes. No fim, "Doo-Woops & Hooligans" tem como maior mérito apresentar um artista extremamente talentoso, com muito conhecimento de mercado e que consegue passear pelos mais variados gêneros sem soar desesperado pelo sucesso a qualquer custo. E nós só temos a agradecer.