É no dia 9 de junho que chegará às bancas a mais nova edição da revista Vanity Fair e com uma capa estampada por ninguém menos que Caitlyn Jenner. Pra quem perdeu, a mulher, que se tornou um dos maiores assuntos comentados em redes sociais como o Twitter e Facebook nos últimos dias, é resultado de um processo de descoberta e transição de Bruce Jenner que, antes de ser representada como realmente se sentia, era uma ex-atleta norte-americana, também conhecida por integrar a família Kardashian que, depois de tanta polêmica envolvendo nudez, sextapes vazadas, futilidades e discussões sobre silicone, ganhou um assunto que realmente merece ser cuidadosamente conversado.
Mas por que a chegada de Caitlyn Jenner é tão importante? As razões estão na nossa cara. Da dificuldade em atribuir artigos nesta própria postagem — o blogueiro que vos fala confessa, pois o menor dos enganos pode significar bem mais do que realmente é e já lemos muito sobre o assunto em outros veículos, que não trataram Jenner como ela realmente deveria ser tratada — aos comentários que lemos desde que ela, linda e a cara da Jessica Lange, de “American Horror Story”, apareceu estampando a capa da grande revista.
A questão é que pessoas transgêneros terminam sendo um tanto deixadas de lado quando a discussão é sobre os direitos e conquistas da comunidade LGBTQ, ao ponto de muitos sequer entenderem o que elas/eles realmente são ou aonde se encaixam no meio de tantas letras, mas ter ela, famosa e com uma carreira significativamente estável antes do acontecimento que, vamos lá, chega a ser doloroso ver sendo tratado como uma polêmica, mostrando quem realmente é de uma maneira tão pública e com tamanha exposição é de grande valor, pois deixa de ser sobre a Kardashian que quer ser assunto só pra chamar atenção e passa a ser sobre uma mulher que, por enquanto, só tem sido o último trending topic, mas caminha, de pouquinho e pouquinho, num importante passo quanto a representatividade das possibilidades de gêneros e, o principal, a difusão de informações.
Numa conversa com o jornalista Buzz Bissinger, que a acompanhou para conhecer seu dia-a-dia para a revista, a ex-atleta afirmou que nunca se perdoaria se morresse sem poder aceitar quem realmente era e, com uma chamada que pede “Me chame de Caitlyn”, se torna uma importante referência para este meio, sendo sua coragem um pontapé que poderá encorajar muitos e muitas outras, além de comprovar de uma vez por todas que, no fim das contas, não há nada de errado em querer ser você, o que está longe de caber apenas à ela, que é rica e famosa. A capa da revista contribui, inclusive, para aproximar a imagem dela que, estando tão distante, consegue dar o tapa na nossa cara para mostrar a realidade de quem realmente é, como realmente se sente e, com todo o respeito que merece, como realmente deve ser tratada.
Trazer essas discussões para a internet brasileira em dois mil e quinze, pouco depois de uma importante emissora nacional ser alvo de críticas pela exibição de beijos entre pessoas do mesmo sexo (não é “beijo gay”, é só “beijo”), em tempo que uma de suas afiliadas anunciou que em breve começará a passar o reality show protagonizado por drag queens, “Ru Paul’s Drag Race”, chega a ser tragicamente cômico. Isso porque, dos fãs de cultura pop aos leigos no assunto, o preconceito em discussões sobre isso ainda é muito presente, do explícito ao disfarçado, do discurso claramente transfóbico e/ou homofóbico ao velado dito pelo cara que “tem até amigos que são”, do hétero que teme ter seus gostos e sentimentos mais íntimos modificados por programas de TV ao homossexual que não gosta de “afeminados” e, infelizmente, daí para pior.
Ainda assim, toda essa conversa veio em boa hora, justamente porque um dos assuntos mais comentados da internet por aqui tem sido uma propaganda da loja de perfumes O Boticário que, numa tentativa de abranger um maior número de pessoas e representar todos os tipos de casais, o comercial da marca para o Dia dos Namorados é protagonizado por três casais, compostos por um homem e uma mulher, um homem e outro homem, uma mulher e outra mulher. A divisão é justa e a matemática está clara até pra quem é de humanas, mas é óbvio que teve quem se incomodasse, é claro que teve quem visse isso como mais uma “afronta para a Família Tradicional Brasileira” e até quem garantisse que essa coisa de homossexualidade está claramente condenada por um tal de Deus numa tal de bíblia... Chega uma hora que a gente se esgota de tanto mimimi e desisti até de discutir. Mas a discussão é um dos meios mais saudáveis de chegarmos num acordo sobre isso, então é por isso que estamos tentando outra vez. Da Caitlyn Jenner lá fora ao comercial de perfumes brasileiro, o mundo vai ser bem mais fácil de lidar se nos importarmos menos em odiar o amor dos outros e amarmos mais — e dizemos isso livres de qualquer preconceito ou discriminação.
*Sonoplasta começa “We Are The World”, do Michael Jackson, RS.*