O mundo é recheado com várias camadas de
injustiças, não diferente do cenário musical. Seja injustiças pequenas, como
aquela música que você até agora não sabe como não virou single
(#JusticeForLegendaryLovers) até injustiças mais desconcertantes, como o caso
Kesha X Dr. Luke. Esse post não trata da batalha judicial entre os dois, mas é
importante termos em mente esse background, pois é ele que funciona como
combustível para a música que analisaremos a seguir.
Enquanto Dr. Luke está cada vez mais rico produzindo os maiores artistas do planeta, como Britney Spears, Katy Perry, Marina & The Diamonds e Nicki Minaj, Kesha sem-mais-o-cifrão está na geladeira desde 2013, quando lançou a farofa folk "Timber", parceira com o rapper e dono de um Grammy (?) Pitbull, que atingiu #1 nos Estados Unidos, Reino Unido e diversos outros charts internacionalmente. Sim, em 2013. Três anos atrás. Parece que foi ontem que estávamos na balada dançando com "Timber" (pode assumir), mas lá se foram três anos.
Enquanto Dr. Luke está cada vez mais rico produzindo os maiores artistas do planeta, como Britney Spears, Katy Perry, Marina & The Diamonds e Nicki Minaj, Kesha sem-mais-o-cifrão está na geladeira desde 2013, quando lançou a farofa folk "Timber", parceira com o rapper e dono de um Grammy (?) Pitbull, que atingiu #1 nos Estados Unidos, Reino Unido e diversos outros charts internacionalmente. Sim, em 2013. Três anos atrás. Parece que foi ontem que estávamos na balada dançando com "Timber" (pode assumir), mas lá se foram três anos.
Se foram três rápidos anos para nós, no meio dessa enxurrada de lançamentos, para Kesha esses três anos provavelmente foram longos e muito sofridos, seja batendo a cara em muros e mais muros que o processo contra o produtor ergueu contra ela, seja pela impossibilidade de lançar um novo álbum, sucessor do glorioso "Warrior", de 2012 - mais um injustiçado desse mundo.
Pois bem, nossa abstinência da hitmaker de “Dancing With The Devil” começou a acabar com “True Colors”, lançada no último 29 de abril. Não, infelizmente não se trata de um novo single do terceiro álbum da cantora, mas não estamos reclamando. “True Colors” é uma faixa do DJ Zedd, aquele mesmo que deu um Grammy pra Foxes com “Clarity” (obrigado, querido) e que produziu faixas ensandecidas com Lady Gaga, como “G.U.Y.” (obrigado mais uma vez, seu lindo).
“True Colors” é a faixa-título do segundo álbum do produtor russo-alemão, lançado em 2015. Na versão lançada originalmente, a canção trazia uma parceria não credita com Tim James, que até ganhou um clipe bem básico há quase um ano. Mas essa música estava destinada e escrita nas estrelas para acabar nas mãos de Kesha.
Caso você não tenha dado muita bola à versão original e está se aventurando apenas agora na produção de Zedd, “True Colors” nada contra a corrente dos atuais deejays – cof cof Calvin Harris cof – que lançam farofa atrás de farofa (o que nós adoramos, não se engane) e vem com uma pegada mais intimista ao ser uma baladinha electro midtempo, com sintetizadores discretos ditando o ritmo nos versos e batidas mais fortes no poderosíssimo refrão, cheio de pequenos sinos que dão todo um climão épico para a coisa.
O single fala sobre o ato de mostrar quem você é de verdade por dentro. Ao contrário do que se pode esperar pelo título (“cores verdadeiras”) e nosso piloto automático de faixas de auto-empoderamento do pop atual, cheias de cor e felicidade, “True Colors” vem com um lado mais obscuro da coisa, refletindo a dualidade humana de carregar partes boas e ruins. Como canta Kesha, ao revelar suas verdadeiras cores haverá “nenhum arco-íris”.
Em termos de melodia, arranjos e produção, a nova versão da canção é exatamente igual à original, porém, há um pequeno fato curioso: nos créditos da composição, Kesha aparece como co-compositora. Mas se é tudo exatamente igual, com exceção, claro, dos novos vocais da mãe dos canibais, como Kesha pode estar creditada? O que muitos não notaram foi uma sutil alteração na letra.
No último verso antes do último refrão, Tim James cantava “Algo me diz que eu sei de absolutamente nada / Nós escapamos das nossas prisões / Mas ainda temos nossos mestres / E de alguma forma é assim que eu esperava”. Na versão de Kesha, a letra é “Algo me diz que eu sei de absolutamente nada / Eu escapei da minha prisão / E tenho nenhum mestre / E de alguma forma é assim que eu esperava”.
A alteração é de suma importância para transformar não só a faixa em algo ainda mais incisivo, mas potencializar a voz de Kesha, roubando o todo para ela. Ao tirar a impessoalidade dos versos de Tim, que cantava “nós” ao invés de “eu”, Kesha explora seu âmago, suas dores e seus dilemas pessoais, que vieram a público com a briga contra Dr. Luke. Tim, mesmo fugindo de sua prisão, ainda era cercado por pessoas que o controlavam. Kesha não. Ela é livre. Sim, o processo anda favorável ao Dr. Luke, mas a liberdade da cantora é o ato de poder falar sobre o ocorrido, o que muitas e muitas mulheres ainda possuem tanto temor em fazer.
“True Colors” consegue ser não apenas um retorno magistral para Kesha, mas um hino que grita a todos os quatro ventos o quanto poder ainda habita dentro dela, o que torna a faixa num pequeno hino de libertação. Kesha aqui é voz para várias mulheres que foram sujeitas a seus mesmos horrores, onde suas cores foram pintadas de preto e branco. Mas, de alguma forma, ela encontra sua força exatamente nesses novos tons e consegue cantar para tantas outras que, além de não possuírem voz, não possuem cor ao serem invisíveis. E ela, doa a quem doer, não vai se desculpar pelo fogo em seus olhos.
Mais uma vez, obrigado Zedd, por estender a mão a uma artista incrível e deixar que ela fale num momento onde é silenciada. Agora Kesha, a gente aguarda um álbum onde você poderá cantar em pé com seus próprios pés.