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Depois de “Viado”, fica difícil te defender, Valesca

Como alguém que admira o seu trabalho ou, na melhor das hipóteses, já admirou, te recordo: você é bem mais do que isso.
Por Leonardo Uller

E aí, Valesca, tudo bom? 

Quem tá falando aqui contigo é uma pessoa que tem o maior carinho pela sua trajetória e arte. Lembro quando, em 2012, fui pela primeira vez em um show seu (foram mais quatro, desde então): eu tinha acabado de me assumir gay em casa, estava numa fase super gostosa e você falou com todas as letras no seu show “se alguém mexer com os gays, mexeu comigo. Manda uma mensagem pra mim no twitter que eu vou ajudar como puder, homofobia não tá com nada”.

Na hora eu só pensei “caraca, que massa isso. Uma funkeira que se importa com a minha dignidade”. Desde então, veio o sucesso nacional em carreira solo com “Beijinho no ombro” e várias declarações bastante acertadas sobre feminismo e LGBTfobia. Mas me decepciona ver você virando as coisas para essas bandeiras agora, num momento em que esses temas efervescem no funk com o trabalho maravilhoso de pessoas como a MC Carol, por exemplo.

Depois de vários singles que não viraram hits e virais, incluindo uma parceria com a homofóbica Cláudia Leitte, e nenhum álbum completo, eis que você aparece com seu novo single: “Viado”. Que péssima escolha, Valesca. Vamos começar com o título, usando essa expressão perjorativa contra a comunidade homossexual. Entendo que você jamais quis ofender os gays usando o termo, mas isso não dá passe livre para você usá-lo em uma música. E nem para milhões de pessoas cantarem uma música com essa palavra que tanto machuca e estigmatiza a comunidade LGBT no Brasil.

Segundo problema, o teor da letra. Nela, você está narrando uma história para o seu amigo gay, o “viado”. Valesca, você precisa urgente saber de uma novidade: esse papo de que o gay tem que ser um acessório na vida das mulheres não tá com nada. É bem bacana que você tenha vários amigos gays, mas se você os trata como poodles, como faz nessa música, não tem nada de bacana nisso tudo.

Isso sem falar no clipe, né? Mais uma vez, a mesma história do boy magia e cheio de tanquinhos e bunda de fora. Nada contra gostar de um cara ABNT, mas essa higienização que a comunidade gay passa há anos, onde só os sarados e bonitos são valorizados é muito triste e faz muito mal pra muita gente (eu, inclusive). Padrões estéticos não devem ser impostos dessa maneira.



Se você algum dia ler isso, quero que leia de coração aberto. É a carta de um fã que, em 2012, se sentiu realizado e contemplado por seu trabalho e hoje está longe de se sentir assim. Tudo isso pra quê? Pra conseguir lucrar em cima da comunidade LGBT? Seu clipe e single não propõem um mínimo de reflexão sobre a comunidade gay e a homofobia, apenas mira no pink money e no reforço de estereótipos – vide a estratégia de divulgação, com o lançamento dentro de um site que nada aborda sobre o empoderamento feminino e LGBT.

Como alguém que admira o seu trabalho ou, na melhor das hipóteses, já admirou, te recordo: você é bem mais do que isso.

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Leonardo Uller é jornalista, tem 22 anos, e foi o autor do trabalho de conclusão de curso “Empoderados: perfis de jovens gays fãs de divas do pop”, sendo também amante do trabalho de artistas como Adele, Beyoncé e Madonna.
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