Indicado ao Oscar de:
- Melhor Filme
- Melhor Ator Coadjuvante (Jeff Bridges)
- Melhor Roteiro Original
- Melhor Montagem
Assim como “La La Land: Cantando Estações”, “A Qualquer Custo” enfrenta certo preconceito em relação ao seu formato. Um neo-western, ou “faroeste moderno”, o longa faz com que o espectador coloque os dois pés atrás e até desista de vê-lo. É interessante que, também como “La La Land”, que é um musical, o formato de “A Qualquer Custo” já foi um dos mais celebrados do cinema.
Imagem: Divulgação/Internet
Os “filmes de cowboy” fizeram sucesso na década de 30 em Hollywood, com John Wayne sendo um dos principais e mais famosos nomes do gênero. Mas, ao contrário dos musicais, que já levaram 11 estatuetas de “Melhor Filme”, o faroeste só alcançou o topo do Oscar quatro vezes: em 1931 com “Cimarron”, 1991 com “Dança Com Lobos”, 1992 com “Os Imperdoáveis” e em 2008 com “Onde os Fracos Não Têm Vez”, o que é até estranho, já que o gênero é tão típico e amado nos EUA.
Assim como todos os gêneros cinematográficos, o faroeste foi mudando com o passar do tempo, adaptando-se às novas tendências e, claro, refletindo a realidade atual. Então acalme-se e não espere um “Três Homens em Conflito” aqui – em “A Qualquer Custo”, o “novo-faroeste” é só a forma de bolo da obra.
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Dirigido por David Mackenzie, o filme conta a epopeia de dois irmãos para salvar a terra da família, atolada em dívidas e prestes a ser perdida para o banco, através de vários roubos de bancos. Tanner (Ben Foster) é ex-presidiário alucinado, enquanto Toby (Chris Pine), molde do “bom moço”, tenta apaziguar toda a loucura do irmão, mesmo entrando no crime. No encalço dos dois estão Marcus Hamilton (Jeff Bridges), um xerife racista e seu parceiro indígena Alberto Parker (Gil Birmingham), saco de pancadas verbal que aguenta inúmeras piadas infames sobre sua ancestralidade.
O filme alterna os pontos de vista, ora sobre os irmãos, ora sobre os policiais. Há um balanceamento bastante esperto por parte do roteiro de Taylor Sheridan. Os irmãos são claramente “vilões” no sentido mais elementar da palavra, já que ambos cometem os crimes que movem a história, porém é muito difícil não sentir empatia pelos dois, principalmente Toby. A cumplicidade entre eles e, principalmente, o contexto que os levou a roubar, consegue moldar um sentimento positivo na plateia, principalmente contra do outro “time”, liderado por um babaca preconceituoso que diminui o colega de trabalho em prol do próprio prazer.
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Pouco a pouco o passado dos irmãos vai sendo revelado e os dramas familiares desenterrados, o que dá ainda mais peso ao arco narrativo motivacional dos irmãos. Haveria uma desconexão e até repulsa por parte do público caso as razões para que eles façam os crimes não ficassem tão claras e fortes. É tipo torcer pelo Walter White em “Breaking Bad”, mesmo sabendo que o que ele faz é errado e passível de culpa em qualquer situação externa.
Outro elemento bastante criativo é a inclusão de placas e outdoors durante todo o filme, mais exatamente quando os irmãos vão até os bancos assaltar, com propagandas sobre empréstimos e saldo de dívidas. Os personagens – e nós, aqui desse lado da tela – somos constantemente lembrados como o dinheiro é importante e como a falta dele é a ruína absoluta. Enquanto passam por essas placas, um combustível a mais é injetado nas veias de Toby e Tanner.
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E é exatamente aqui que reside uma das maiores belezas de “A Qualquer Custo”: o estilo neo-western é apenas o esqueleto da obra – sua carne é formada por uma crítica às mazelas do capitalismo. O “american dream” já se encontra num ponto distante em plena segunda década do século XXI, restando as rachaduras desse utópico mundo perfeito. Obviamente o crime não é a solução para esse sistema que apresenta muitos problemas, mas as ações do filme rendem ótimas e relevantes críticas sociais.
Se o formato faroeste está no espaço geográfico, na noção de justiça e, claro, no jogo de gato e rato entre o xerife e os bandidos, a outra totalidade da obra abraça o suspense e a ação – as cenas dos roubos são deliciosamente bem construídas pela dinâmica dos irmãos, enquanto suas fugas são elétricas e energizantes. A fotografia – linda de doer –, que dá foco nas cores daquele mundo decrépito, é potencializada pela montagem ágil e ditadora do ritmo. Não há composição técnica fora do lugar em “A Qualquer Custo”.
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Há, como é de esperar, clichês dentro do roteiro, principalmente por parte de Hamilton, o xerife de meia idade, prestes a se aposentar, se agarrando ao seu último caso – e interpretado com louvor por Bridges. No entanto, bastante inteligência é empregada no personagem, o único ali a entender o método de roubo dos irmãos. Com o decorrer do longa, cria-se o palco para que os dois núcleos finalmente se encontrem para a derradeira batalha do binarismo “bem X mal” – felizmente bem composto pelos subtextos de cada núcleo.
“A Qualquer Custo” é um filme econômico e simples, mas corretíssimo e contemporâneo. Há um belo acréscimo ao gênero e principalmente relevantes discussões sociais sobre a ganância dos bancos, a concentração de dinheiro e poder, os corredores sujos do sistema e como as pessoas se vêm forçadas a burlá-lo quando são postas em posição de aceitação da própria pobreza. No fim das contas, todos ali são vítimas das mãos de ferro do capitalismo e o binarismo deixa de existir. Um filme que encontra beleza no confronto do lado mais feio do sistema e prova que nem sempre o maior acerto é uma história totalmente nova, mas sim a forma como você conta uma história já conhecida.