O reality "RuPaul's Drag Race" está vivendo o seu apogeu. Prêmios, recordes de audiência, popularidade à mil e dois Emmys de "Melhor Apresentador" na estante são as comprovações do sucesso e da importância do maior exemplar da arte drag na contemporaneidade. Aproveitando o embalo, Mama Ru deu uma entrevista ao The Guardian onde falou do programa e soltou alguns comentários que se destacaram.
Segundo o apresentador, mulheres cisgêneras e trans mulheres não são bem vindas no "Drag Race". Sobre mulheres cisgêneras , ele explica:
Drag perde o sentido de perigo e de ironia quando não é feito por homens, porque seu objetivo é um manifesto social e um f*da-se para a cultura dominada por homens. Então homens fazendo isso é realmente punk rock, porque é a real rejeição da masculinidade.
Quando questionado sobre mulheres trans, Ru hesita e fala:
Provavelmente não [aceitaria mulheres trans no programa]. Se você se identifica como uma mulher e faz a transição, você muda a partir das mudanças no seu corpo. Vira algo diferente; isso muda todo o conceito do que estamos fazendo. Nós tivemos algumas garotas que já fizeram enchimentos no rosto e talvez um pouco de implantes aqui e acolá, mas elas não estavam em transição.
Peppermint, famosíssima drag queen de Nova York, foi a primeira participante a entrar no programa sendo abertamente trans, na nona temporada - ao contrário de várias outras, que se identificaram como trans durante - Monica Beverly Hillz, Sonique - ou depois do show - Gia Gunn, Carmen Carrera. Sobre Peppermint, Ru comenta: "Ela não tinha implantes mamários até sair do programa; ela se identificava como mulher, mas não havia feito a transição".
A própria Peppermint, na final de sua temporada, foi questionada como poderia ser uma mulher trans e drag queen ao mesmo tempo, respondendo: "Mulheres trans sempre contribuíram para a incrível arte drag, desde o começo dos tempos. Isso não é novidade. Minha contribuição ao mundo drag é tão poderosa quanto a de qualquer homem gay", sendo aplaudida. Monica, na final da quinta temporada, respondeu o mesmo: "Drag é o que eu faço, trans é quem eu sou".
Essa matéria não tem o intuito de ser didático no que tange à sexualidade e gênero humano, e muito menos ser lenha para colocar RuPaul numa fogueira, todavia, o discurso da drag queen mais rica do mundo é preocupante quando transforma o "Drag Race" num Clube do Bolinha - só homens podem entrar. É certo que o programa é dela, são as regras dela, porém tal declaração perigosamente cai na casinha da transfobia ao querer excluir uma comunidade que já é tão oprimida dentro do próprio meio LGBT - Peppermint comentou no próprio reality como passou anos com medo de aceitar sua transexualidade, temendo não ser mais aceita na cena drag.
E esse não é o primeiro close errado do apresentador: questionado sobre o porquê de não ir "montado" na entrega do Emmy, ele falou: "Para mim, [drag] é um negócio, então você não vai me ver montado se eu não estiver sendo pago". O quão problemática é essa fala? O que poderia - e deveria - ser um ato fundamentalmente político, acaba sendo moeda de troca. É óbvio que a arte deve sim ser valorizada e muito bem paga - "Lembra dos cara achando que consumação paga peruca?", já cantava Gloria Groove -, mas quando o lado comercial vem antes do político, a coisa fica complicada. Já imaginou o quão revolucionário seria uma drag queen de saltão e cílios postiços recebendo o maior prêmio da televisão?
Em entrevista à Oprah, Ru comenta que, caso tivesse que parar hoje de fazer drag, estaria bem com isso. Seria uma sensação de "dever cumprido" depois de anos na arte ou puro descaso? É certo que o universo criado por ele é de suma importância para o mundo queer, entretanto: amiga não tem como te defender, não tem como ficar do teu lado, bicha.
Meu telão está morto.
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