Dias atrás fui com a minha mãe assistir “A Forma da Água”, vencedor de quatro categorias no Oscar 2018, incluindo a mais cobiçada da noite: Melhor Filme. Fui na estreia, animada. As expectativas estavam altas. Minha mãe, contudo, não sabia muito sobre do que se tratava o longa, mas foi mesmo assim. Passados 40 minutos de filme, ela vira e diz “acho que vou embora”. Pergunto o porquê e ela diz “nossa, estou odiando esse filme”. Peço para ela ficar até o final e assim ela, claramente entediada, fica.
Quando saímos da sessão, a primeira coisa que ela diz é “nossa, que filme chato”. Minha resposta é: “não sei como não gostou, está indicado a várias categorias no Oscar!”. Numa das minhas reflexões inúteis sobre a vida pensei nesse episódio e em como meu argumento para justificar que o longa era bom foi infeliz. Ela, em momento algum, disse que o filme era ruim tecnicamente. Apenas que era chato. E qual é o problema disso?
O Oscar conta com uma criteriosa (e complexa) votação para escolher os indicados e vencedores da premiação. Não vou me estender muito porque o negócio é bem complicado – e não vou entrar no mérito do justo ou injusto, da realidade e do que seria ideal –, mas um dos processos de escolha pede que os mais de 6 mil membros da Academia elenquem, numa lista, dos que mais gostaram até os menos prediletos. Obviamente os critérios que os levam a escolher filme X em detrimento de Y não são banais (pelo menos espera-se que não sejam). Tudo conta; inclusive, mesmo que numa discreta parcela, os gostos ou conceitos pessoais.
A arte, feliz ou infelizmente, não é como um esporte, que quem faz mais gols, cestas ou pontos, ganha. Então, se não há consenso nem dentro da Academia, que é composta por figurões do mercado cinematográfico, por que minha mãe tem que ter a mesma opinião que eu sobre "A Forma da Água"?
Algo curioso sobre o não-gostar de certo filme é que as pessoas que apreciam tal obra sempre rebatem e tentam explicar porque as que não gostam estão erradas. Com música, pelo menos do que tiro de minhas experiências pessoais, é diferente. Eu, por exemplo, odeio a música “Evidências” com todas as minhas forças. Tenho a infelicidade de ouvi-la em quase todo karaokê, churrasco e fim de festa. É a hora em que todos se abraçam e cantam a todo pulmão este clássico sertanejo e eu só manifesto, para todos à minha volta, o quanto odeio esta canção. A não ser que Freud tenha uma explicação mais profunda para o meu desgosto por “Evidências”, eu, que me conheço há 23 anos, não tenho justificativa alguma para isso. Eu simplesmente não gosto e ponto. Nunca fui indagada por isso.
Porém, com filmes, principalmente aqueles "de arte", o “porquê” é quase inevitável e ai da pessoa que se embananar nos argumentos de resposta. "Ele(a) não entendeu o conceito", dizem. Porque, afinal de contas, não existe a possibilidade de entender o conceito e simplesmente não gostar, não é? Abro, ainda, um parêntese: quantas vezes não criamos pré-conceitos sobre alguém pelo gosto cinematográfico? “É fã de Star-Wars? Ih, deve ser um(a) daqueles(as) nerds bitolados(as)”. “Para gostar de filme baseado em livro do Nicholas Sparks tem que ser aquelas pessoas bem melosas”. Pense bem. Você já fez isso. Eu, pelo menos, já fiz e aproveito esse texto para fazer um mea culpa por todos que julguei, mesmo que inconscientemente, pelo gosto (ou não) por certos filmes ou figuras do cinema.
Mas voltando ao Oscar: por que é tão importante termos os mesmos gostos daqueles que integram a Academia? Precisamos mesmo comprar tudo o que ela nos vende? A resposta é não. O Oscar, mesmo sendo controverso, ainda é a mais importante premiação do cinema e por isso carrega tanto peso e responsabilidade, mas não deve moldar quem somos ou o que gostamos. Ninguém é melhor ou pior por gostar ou não de certas produções. O guilty pleasure não deveria ter o guilty no nome; somente o pleasure. Tudo bem eu, até hoje, gostar da saga "Crepúsculo". Minha mãe continua não gostando de "A Forma da Água" e deixou isso claro enquanto assistíamos à premiação, já que toda vez que o longa aparecia como um dos indicados à determinada categoria ela dizia "nossa, esse filme é muito chato". E tá tudo bem.