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Os 30 melhores filmes de 2023

2023 foi um ano bastante feliz no que tange o Cinema, com filmes que nasceram como clássicos. Agora que estamos descontando tudo o que perdemos no mundinho da Sétima Arte nos tenebrosos anos de pandemia, estamos recheados de filmes fantásticos chegando nos cinemas, então é claro que teríamos que vir aqui com os filmes favoritos de 2023.

Caso você já conheça o Cinematofagia, o foco aqui sempre foi e sempre será a busca por filmes que não necessariamente estejam no radar na grande indústria - principalmente quando olhamos para a distribuição brasileira, que ainda sofre com atrasos de meses em comparação com estreias internacionais, inclusive de países minúsculos - vários longas já aclamados lá fora chegam aqui com muuuuito atraso, mas tudo bem.

De vencedores do Oscar a pérolas de todos os cantos do mundo, os critérios de inclusão da lista são os mesmos de todo ano: filmes com estreias em solo brasileiro em 2023 - seja cinema, streaming e afins - ou que chegaram na internet sem data de lançamento prevista, caso contrário, seria impossível montar uma lista coerente. E, também de praxe, todos os textos são livres de spoilers para não estragar sua experiência - mas caso você já tenha visto todos os 10, meu amor por você é real.

Sem mais delongas, os melhores filmes de 2023:

 

30. Monstro (Monster)

Direção de Hirokazu Kore-eda, Japão.

Contado em três partes, cada uma sob o ponto de vista de um personagem central, "Monstro" é mais uma maravilha de Hirokazu Kore-eda, vencedor da Palma de Ouro pelo ótimo "Assunto de Família" (2018). Seu novo longa começa com a visão da mãe de um garotinho que começa a agir de forma estranha, tendo como suposta causa os maus-tratos do professor. A segunda parte, é a vez do professor dar sua versão dos fatos, que só será amarrada no final, quando finalmente vemos tudo pelos olhos do menino. De uma sensibilidade absurda, "Monstro" é um conto LGBTQIAPN+ que sabe conduzir o "romance" da forma fidedigna com as crianças envolvidas, sem nem entender exatamente o que está acontecendo. Não por acaso, venceu a Queer Palm no Festival de Cannes, que premia o melhor filme queer do ano.


29. Folhas de Outono (Kuolleet Lehdet)

Direção de Aki Kaurismäki, Finlândia.

Aki Kaurismäki é conhecido na Finlândia (e no mundo) por retratar dramas sobre o proletariado do país. "Folhas de Outono" veio para completar a "Saga do Proletariado" do diretor, que havia parado em 1990 com a obra-prima "A Garota da Fábrica de Caixas de Fósforos". Longe da crueza obscura do citado, "Folhas de Outono" tem uma veia engraçada bastante interessante, contrastando com os personagens tragicômicos da repositora de um supermercado que se apaixona por um alcóolatra que não para em um só emprego. A estranheza das situações, diálogos e indivíduos dão um ar autoral incrível para a obra, representante finlandês para o Oscar 2024.


28. O Assassino (The Killer)

Direção de David Fincher, EUA.

Dividido em várias partes com "missões" diferentes, o novo filme do lendário David Fincher começa com uma letargia desanimadora: seguimos a rotina tediosa de um matador de aluguel (Michael Fassbender) esperando sua presa aparecer em sua mira, e Fincher não economiza no destaque desse tédio. Caso você consiga superar as primeiras partes, encontrará uma perseguição deliciosa do assassino em questão buscando vingança para as pessoas que tentaram matar sua esposa (interpretada pela nossa brasileira Sophie Charlotte!). Cheio de personagens divertidos e sequências eletrizantes, é um alívio ver a Netflix investindo em produções de qualidade, e não no amontoado de quantidade descartável que a plataforma é tão conhecida.


27. O Hotel Royal (The Royal Hotel)

Direção de Kitty Green, Austrália.

A australiana Kitty Green largou os documentários para embarcar em dramas femininos que exploram opressões em diferentes ambientes. Depois de sua ótima estreia com "A Assistente" (2019), Green se baseia em uma história real para costurar "O Hotel Real": duas meninas começam a trabalhar no bar de um hotel no meio do mais absoluto nada para juntar dinheiro, mas chegar seria muito mais fácil que ir embora. O microcosmo do hotel é espelho que amplifica as mais diversas camadas de misoginia, que vão de piadinhas infames até violências mais pungentes. O suspense do roteiro vai engalfinhando a plateia, que permanece imóvel e preocupada pelo destino das duas.


26. A Garota das Estrelas (The Starling Girl)

Direção de Laurel Parmet, EUA.

Jem vive em uma comunidade cristã ultraconservadora, se separando do "mundo exterior" e sendo, para seus pais", a filha perfeita que serve de exemplo aos olhos dos irmãos mais novos e, claro, de deus. Quando o filho do pastor da comunidade, 10 anos mais velho que a garota, retorna de uma viagem missionária, os caminhos dos dois vão se cruzar e causar rupturas permanentes no santíssimo grupo. Nesse coming-of-age mais que competente, Laurel Parmet estreia com louvor no Cinema e entrega tudo o que podemos esperar: a forma como a religião aprisiona principalmente mulheres, deturpando a noção da realidade e sociedade de todos os envolvidos. Só podemos esperar o caos.



25. Amor Segundo Dalva (Dalva)

Direção de Emmanuelle Nicot, Bélgica/França.

"Amor Segundo Dalva" entrega uma das premissas mais... desconcertantes do ano. Dalva é uma menina de 12 anos que se veste, age e vive como uma mulher adulta. Todos ao seu redor, ao conhecê-la, ficam confusos com o motivo, criando uma barreira entre ela e as outras crianças. Ao ser entregue para o conselho tutelar, os motivos ficam claros: ela era abusada pelo próprio pai, que a convenceu de que ela era o "amor da sua vida". É um show de horrores que jamais perde a mão, quando a diretora conduz tudo com cuidado e delicadeza - nunca os abusos ficam escancarados, permanecendo implícitos. Emmanuelle Nicot então cria uma epopeia de Dalva em busca de sua inocência ao reaprender a ser criança, e de como a pessoa que mais nos machuca é aquelas que teoricamente mais nos ama.


24. O Cafetã Azul (Le Bleu du Caftan)

Direção de Maryam Touzani, Marrocos/França.

"O Cafetã Azul" vai no seio da vida do casal Halim e Mina, donos de uma loja de cafetãs. Há um latente distanciamento entre os dois, burlado pela doença da esposa. Com isso, eles devem contratar um ajudante para a loja, e Youssef, o ajudante, é um gatilho para o marido, que até então levava uma vida homossexual escondida. A velha história do homem de família que esconde sua sexualidade é ressignificada pela pureza de Maryam Touzani, que conduz um drama tocante ao estudar a maneira que a chegada de Youssef é algo definitivo na vida de todo mundo. O significado do título, quando revelado, é de partir e encher o coração.


23. A Filha Eterna (The Eternal Daughter)

Direção de Joanna Hogg, Reino Unido/EUA.

Depois de "Suspiria" (2018), quando Tilda Swinton interpretou TRÊS papéis ao mesmo tempo, a atriz agora decidiu que um só personagem é besteira. Em "A Filha Eterna", ela interpreta mãe e filha que vão até um hotel, em busca de inspiração para o novo filme da filha, sobre a própria mãe. O hotel em questão, foi moradia da mãe na infância, e está recheado de fantasmas do passado - todavia, esses fantasmas podem ser reais? O drama gótico de Joanna Hogg é um belíssimo (tanto no visual quanto no enredo) estudo sobre a relação das duas mulheres, com absolutamente tudo ao redor sendo efeitos-colaterais dessa relação. O final pode parecer um plot-twist, mas na verdade é um simbolismo cinematográfico que vai muito além de uma surpresa que busca enganar o espectador.


22. A Morte do Demônio: A Ascensão (Evil Dead Rise)

Direção de Lee Cronin, EUA.

Em 2013, o remake de "A Morte do Demônio" prometeu ser uma das mais assustadoras obras que o Cinema já pôs os olhos. Um sabor como terror, gore e insanidade que é característica da franquia, tivemos que esperar 10 anos para uma continuação, e a espera valeu a pena. "A Morte do Demônio: A Ascensão" consegue ir além e superar o filme de 2013 quando segue uma família arruinada que encontra o último prego no caixão quando o Livro dos Mortos cai em suas mãos. São 97 minutos de puro horror e com personagens fantásticos e uma das melhores atuações do ano: Lily Sullivan como a maestrina do gore.


21. Sem Ursos (Khers Nist)

Direção de Jafar Panahi, Irã.

O iraniano Jafar Panahi ficou famoso com seu estilo de misturar realidade com ficção, se inserindo em seus próprios filmes como um personagem central. Em "Sem Ursos", ele usa sua própria condição política - de ser impedido de deixar o Irã - como condutor do enredo: enquanto tenta dirigir um filme ao lado da fronteira, se mete numa confusão quando vira testemunha de uma briga familiar cunhada à base de religião e tradições conservadoras. "Sem Ursos" é mais um grito contra um país repressor que fez o diretor ir parar atrás das grades por sua "propaganda contra o regime". Cinema político em seu auge. 



20. Carvão (idem)

Direção de Carolina Markowicz, Brasil/Argentina.

Longa-metragem de estreia de Carolina Markowicz (que aparece DUAS vezes na presente lista), "Carvão" encontrou sucesso nacional e internacionalmente pela engenhosidade da diretora e roteirista: no interior de São Paulo, uma mulher aceita a proposta de esconder um traficante argentino em sua casa, tendo que substituir seu pai doente pelo homem sem que ninguém saiba. As entranhas dessa vila são expostas de forma crua e nua pelas lentes do filme, tendo como raiz de todo o horror uma sociedade desigual que faz as pessoas perdem a humanidade em troca de sobrevivência. 


19. Saltburn (idem)

Direção de Emerald Fennell, Reino Unido/EUA.

Recém aclamada logo na sua estreia com "Bela Vingança" (2020), Emerald Fennell retornou com o badalado "Saltburn" e não decepcionou. Seguindo um estudante que fica obcecado por um colega de faculdade, a ponto de adentrar na vida do garoto e arruinar tudo, "Saltburn" viralizou pelas suas cenas polêmicas - principalmente a da banheira e do cemitério -, contudo, o filme vai muito, mas muito além do choque. Sim, o shock value está lá para causar burburinho, porém, são elementos seminais para a exploração da insanidade do protagonista, que não mede esforços para ascender socialmente. 


18. A Sucata (Scrapper)

Direção de Charlotte Regan, Reino Unido.

Mais uma estreia feminina na nossa lista, "A Sucata" conta a história de uma garotinha que mora sozinha após a morte da mãe - ela nunca conheceu o pai e engana o governo dizendo que mora com um tio inexistente. Habitando quase integralmente num mundo de fantasia, ela só volta à realidade quando a falta da mãe bate à porta - e quando seu pai finalmente aparece. Um doce mistura de drama e comédia, o longa é de um charme invejável, e um irmão distante e britânico da obra-prima "Projeto Flória" (2017) ao acompanhar a vida das crianças e seus castelos encantados a fim de fugirem de suas duras vidas.


17. Bom Garoto (Meg, Deg & Frank)

Direção de Viljar Bøe, Noruega.

"Bom Garoto" foi um exemplo benigno das viralizações na internet, ganhando popularidade no Twitter apenas com sua sinopse: uma garota conhece um milionário em um aplicativo de encontros. Tudo parece incrível, até que ela conhece o bichinho de estimação do cara, Frank, um homem vestido de cachorro. Trabalho de conclusão de curso de Viljar Bøe, "Bom Garoto" é tudo o que a premissa coloca na mesa, uma bizarrice absurda que vai entrando em rumos cada vez mais estranhos. Com cenas impactantes e um final perfeitamente chocante, é bem verdade que o clímax cai num tom caricato em demasia (e não é um filme para todos os paladares), porém, tudo é compensado pela direção incrível e as curvas derrapantes do roteiro.


16. Raquel 1:1 (idem)

Direção de Mariana Bastos, Brasil.

Mais um elemento do Novíssimo Cinema Brasileiro ao colocar suas mãos em discussões sociais embaladas em premissas extremamente criativas: Raquel é uma adolescente que, após uma tragédia, se curva à religião. A questão é que, quanto mais Raquel fortalece sua fé, mais ela discorda dos preceitos escritos na Bíblia, principalmente sobre a visão submissa da mulher. Então ela decide fazer algo que chocará toda a cidade: reescrever as escrituras sagradas. "Raquel 1:1" se deita sobre "Carrie: A Estranha" (1976) e "Santa Maud" (2020) nesse conto sacro, feminista e disruptivo que une folclore, cultura e elementos de terror para colocar a plateia para pensar nos símbolos que deixam dúbio o papel de Raquel como messias de uma nova crença.



15. Anatomia de Uma Queda (Anatomie d'une Chute)

Direção de Justine Triet, França/Alemanha.

Talvez o filme internacional mais aclamado desde "Parasita" (2019), "Anatomia de Uma Queda" começou sua premiada carreira ao ganhar a Palma de Ouro no Festival de Cannes 2023, e também pudera: a obra trabalha com elementos simples, mas de formas complexas. Um homem é encontrado morto ao lado de sua casa, e a principal suspeita é sua esposa, interpretada brilhantemente por Sandra Hüller. A única testemunha é o filho cego do casal. Afinal, ela matou ou não o marido? O longa passeia pelo "filme de tribunal" e o filme "quem será o culpado?" com um roteiro poderosíssimo, um quebra-cabeças tão cheio de emaranhados que escrever o roteiro deve ter sido um pesadelo. Um pilar fantástico de como nossa percepção muda até mesmo a verdade.


14. Tori & Lokita (idem)

Direção Luc & Jean-Pierre Dardenne, Bélgica/França.

Os irmãos Dardenne estão desde 1987 explanando diversos cosmos sociais da Bélgica, que inesperadamente são universais. Indicados NOVE vezes à Palma de Ouro no Festival de Cannes - com duas vitórias -, os belgas são aclamados pela crueza e coragem de seus filmes, e com "Tori & Lokita" não poderia ser diferente: dois imigrantes africanos tentam sobreviver na Bélgica em meio a racismo, misoginia e um sistema que está empenhado em separá-los. Com um tom documental, o longa é uma jornada dolorosa que discute a crise imigratória na Europa e como esses imigrantes são corpos sujeitos à marginalização - até serem descartáveis.


13. Tár (idem)

Direção de Todd Field, EUA/Alemanha.

Lydia Tár é uma maestrina de absurdo sucesso e conduz uma das melhores orquestras do mundo. Por trás de todo o glamour de sua abarrotada agenda, Lydia deve lidar com o casamento ameaçado, sua carreira em corda bamba e fake news sobre seu caráter. "Tár" tem quase 3h, em um robusto filme que está para a música clássica como "Cisne Negro" (2010) está para o balé e "Demônio de Neon" (2016) está para a moda, estudando as percepções de estrelas na mídia e a ascensão e queda de ídolos. Se o texto consegue carregar tantos temas complexos com maestria (bah dum tss), é a atuação lendária de Cate Blanchett que eleva a sessão a um patamar de obra-prima e que fará "Tár" ser lembrado por toda a história.


12. Propriedade (idem)

Direção de Daniel Bandeira, Brasil.

Uma grande fazenda, com todos seus empregados vivendo na propriedade, tem uma reviravolta quando o rico dono decide vender o terreno, o que expulsará todos os empregados. Ao visitar a casa, a esposa do dono se tranca dentro do carro blindado ao perceber a revolta violenta dos empregados, tendo apenas a lataria reforçada como proteção. "Propriedade" não poderia ir em um ponto mais óbvio na sua crítica do que a propriedade privada, a entidade elementar do Capitalismo que divide e segrega por meio de cercas. É ainda mais criativo ter um carro blindado, item de luxo dos 1% que habitam o topo da sociedade, como fortaleza, e a película brinca sadicamente com a vida dos envolvidos, mais um impulso cinematográfico nacional, que tem encontrado uma nova safra impecável a partir da década passada a fim de criticar nossos arredores. Não dá para esperar humanidade de alguém que foi tratado como animal a vida inteira.


11. Subtração (Tafrigh)

Direção de Mani Haghighi, Irã.

Farzaneh é uma esposa que, num dia qualquer, ver o marido entrando em um apartamento estranho. Ao envolver toda a família no aparente escândalo de infidelidade, ela descobre que existe uma mulher exatamente igual a ela casada com um homem exatamente igual ao marido. Com uma trama que faria Alfred Hitchcock correr para um estúdio, "Subtração" é um neo-noir fabuloso sobre um chavão cinematográfico, as cópias/duplos. Ao conhecerem ainda mais o outro casal, suas semelhanças físicas são chocadas com as diferenças de personalidade, e as duas famílias entrarão em conflitos que mostram que nossos eus ruins sempre podem destruir nossos melhores eus.



10. A Piedade (La Piedad)

Direção de Eduardo Casanova, Espanha/Argentina.

Eduardo Casanova ficou famoso mundialmente logo no seu filme de estreia, "Peles" (2017), que com toda a certeza será uma das obras mais bizarras que você verá na vida (está disponível na Netflix, aproveite). Sua segunda película, "A Piedade", estava envolta de muita curiosidade por parecer seguir os moldes que formavam o cinema "casanovadiano": personagens estranhos, cenas desconcertantes e um design de produção cor-de-rosa. Aqui, uma mãe chamada Piedade é obcecada pelo seu filho, e a relação disfuncional dos dois vai sofrer um baque com o diagnóstico de câncer do filho. É verdade que "A Piedade" não vai até aonde "Peles" vai no quesito "o que diabos é isso", porém, é um capítulo fabuloso na filmografia do espanhol, um pilar chiquérrimo (e excêntrico) do cinema queer.


9. Segredos de Um Escândalo (May December)

Direção de Todd Haynes, EUA.

Uma atriz (Natalie Portman) vai passar um tempo na casa de uma mulher (Julianne Moore) nacionalmente famosa por um relacionamento pedófilo que permanece até hoje, a fim de canalizar a mulher para o filme de sua vida. Todd Haynes, diretor de um dos melhores filmes LGBTQIAPN+ do século, "Carol" (2015), finalmente retorna ao auge emulando Pedro Almodóvar em "Volver" (2006), Ingmar Bergman em "Persona" (1966) e Richard Eyre em "Notas Sobre um Escândalo" (2006) para compor outro drama magistral, estrelado por duas atrizes em performances monstruosas que destroem todas as cenas. "Segredos de Um Escândalo" tem pelo menos duas cenas para os livros de história - o final é insanamente perfeito.


8. Beau Tem Medo (Beau is Afraid)

Direção de Ari Aster, EUA.

Um dos melhores diretores da atualidade, Ari Aster tinha um problemão em mãos: conseguir manter o nível dos seus dois primeiros filmes, "Hereditário" (2018) e "Midsommar: O Mal Não Espera a Noite" (2019). O mais curioso é que, se nos dois citados, o diretor teve que entrar no maquinário da indústria e moldá-los de acordo com o gosto da A24, sua distribuidora parceira, "Beau Tem Medo" recebeu carta branca para Ari despirocar e fazer o que diabos quisesse. O resultado? Um pesadelo satírico como nenhum outro. Sob o comando do vencedor do Oscar Joaquin Phoenix, "Beau Tem Medo" são 3h de insanidade que segue Beau em uma epopeia para chegar na casa da mãe após um acidente. Com sequências alucinógenas, cenas sem o menor sentido aparente e plot-twists incalculáveis, você passará dias tentando montar o quebra-cabeças do "mommy issues" do ano - e olha que acabamos de falar de "A Piedade". 


7. Até Amanhã (Ta Farda)

Direção de Ali Asgari, Irã/Catar.

Fereshteh é uma mãe solteira no coração do Irã, um escândalo por si só. Ela esconde a criança de todo mundo, com apenas duas pessoas sabendo da existência da filha: Atefeh, sua melhor amiga; e Yaser, o pai da criança que não tem o menor interesse em assumir o papel. Fereshteh segue bem com a vida, mediante a situação, mas tudo parece que está por um fio quando sua família informa que fará uma visita surpresa. Ela então corre pela cidade, à procura de alguém que poderá ficar com a menina por apenas uma noite. "Até Amanhã" é um drama impecável que estuda a vulnerabilidade da mulher num país que pinta um filho "ilegítimo" como desonra absoluta. Cada minuto que passa, mais o público se aflige com a situação de Fereshteh, que entrega uma das mais fantásticas cenas do ano - a do táxi. 


6. Como Fazer Sexo (How to Have Sex)

Direção de Molly Manning Walker, Reino Unido/Grécia.

Viajando pela beleza e feiura da juventude, "Como Fazer Sexo" segue uma ideia simples: três garotas, durante as férias da escola, embarcam numa viagem que promete ser o auge de suas vidas até então. Soa como uma comédia norte-americana dos anos 2000, contudo, este é um filme tão profundo quanto o oceano que banha as praias paradisíacas do local, conseguindo ativar gatilhos quando aborda o consentimento sexual feminino. O mundo heterossexual é um fardo para as mulheres (não impressiona que a única relação funcional da fita é entre duas meninas), todavia, mesmo com todas as dores, "Como Fazer Sexo" mostra como essa fase da vida pode nos fortalecer ou destruir se tivermos as pessoas certas ao nosso lado. Você só sabe o que a vida realmente é se já tiver voltado para casa chorando depois de uma festa.



5. Doente de Mim Mesma (Syk Pike)

Direção de Kristoffer Borgli, Noruega/Suécia.

O norueguês Kristoffer Borgli encontrou sucesso no país e, sem impressionar, já caiu nas graças de Hollywood - seu primeiro filme feito nos EUA, "O Homem dos Sonhos", foi produzido pela meca do Cinema contemporâneo, a A24. Mas, colado com sua estreia internacional, ele lançou "Doente de Mim Mesma". Na comédia, uma mulher é patologicamente viciada em atenção. Quando o namorado, um artista que rouba sofás para realizar suas obras, ganha notoriedade, ela vai até o limite para que os olhares recaiam sobre ela. "Doente de Mim Mesma" (tradução mais que perspicaz do título) é uma saga tresloucada que cava um buraco para se enterrar da forma mais divertida possível, afinal, tem nada mais terapêutico que assistir a pessoas malucas sendo malucas.


4. Pedágio (idem)

Direção de Carolina Markowicz, Brasil.

Premiada pelos seus curtas, a paulistana Carolina Markowicz debuta como um dos grandes nomes do cinema tupiniquim com a dobradinha "Carvão" e "Pedágio". No último, uma mãe vai parar nas garras do crime com o intuito de juntar dinheiro para mandar o filho homossexual para uma terapia evangélica de "cura gay". Cinema brasileiro em seu mais cristalino estado, "Pedágio" vai nos becos do país para estudar como a homofobia encontra as mais longínquas esquinas para ter forças, tendo como terreno fértil a hipocrisia gospel. Não se engane, a sinopse pode soar como um drama denso sobre sexualidade, mas não, aqui é uma fita hilária pela condução do absurdo - e, sim, chocante ao notarmos que tudo na tela é reflexo do real, sem jamais deixar as brasilidades de lado para fortalecer a cultura dentro e fora da tela.


3. Piscina Infinita (Infinity Pool)

Direção de Brandon Cronenberg, Canadá/Croácia.

Em 2022, David Cronenberg - um dos pais do horror norte-americano - voltou à velha forma com o incrível "Crimes do Futuro"; em 2023, é a vez do seu filho. Brandon Cronenberg prova que é um pupilo exemplar do Cinema de seu pai ao lançar "Morte Infinita": um rico casal está em luxuoso resort e verá suas férias (e suas vidas) pegarem um caminho monstruoso ao conhecer outro casal veterano. Ao causarem um acidente, os ricaços descobrem uma das leis do país: assassinato é pago com a morte do culpado pelas mãos da família da vítima, todavia, quem tem dinheiro tem uma saída, e no universo fílmico de "Morte Infinita" há um segredo macabro. Alexander Skarsgård e Mia Goth (que diz "SIM!" para qualquer roteiro que a descreve como "personagem psicótica") dão vida (e morte) para um roteiro narcotizante que possui cada vez mais camadas quanto mais você reflete sobre. O último pilar da "Santíssima Trindade do Transhumanismo Contemporâneo", ao lado de "Crimes do Futuro" e "Titânio" (2021). Amém.


2. Fale Comigo (Talk to Me)

Direção de Danny & Michael Philippou, Austrália.

A A24 se tornou o messias dos fãs de terror, provando lançamento após lançamento como realizar fitas nesse que é um gênero tão hercúleo: "A Bruxa" (2015), "Hereditário" (2018), "Clímax" (2018), "Cordeiro" (2021), "Men: Faces do Medo" (2022) e "Pearl" (2022) são apenas alguns exemplos que comprovam essa afirmativa. Então, havia muita expectativa em cima de "Fale Comigo", a grande aposta do estúdio para 2023, e a espera valeu a pena. No longa, uma galera se junta para brincar com uma mão embalsamada que os conecta com o mundo dos mortos. É claro que a brincadeira logo foge do controle e o pandemônio se instaura. "Fale Comigo" tem o ingrediente básico para um horror de sucesso: a falta de esperança. Tudo é posto na tela com um sabor amargo, e recebemos cenas perversas que nos remete aos maiores, como "O Exorcista" (1973). Tem elogio melhor?


1. A Baleia (The Whale)

Direção de Darren Aronofsky, EUA.

Um dos longos mais polêmicos de 2023 - o que não é raridade dentro da carreira de Aronofsky, "A Baleia" conseguiu abocanhar dois Oscars e marcar o retorno triunfal de Brendan Fraser, que levou o careca de "Melhor Ator" ao viver um professor obeso em seus últimos dias de vida. A carga dramática de "A Baleia" engalfinha por um peso emocional raro - curiosamente, mesmo com toda a dor do texto, o filme possui o final mais esperançoso de toda a filmografia de Aronofsky, no entanto, chegar até lá é uma tortuosa viagem que com certeza não agradará a todos. A cereja do bolo que refletiu o status de obra-prima para "A Baleia" veio quando, na cena final, em uma revelação que amarra toda a história, uma pessoa sentada ao meu lado na sessão levou as duas mãos ao rosto em completo frenesi. É a beleza da tristeza e a feiura da alegria em um dos mais arrebatadores finais da década, que arrancaram minhas lágrimas como nunca antes diante da Sétima Arte.

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As 20 melhores atuações do Cinema em 2023


Mais um ano se encerrando e, claro, o Cinematofagia não abre mão do seu solene compromisso de listar as melhores performances no Cinema de 2023.

De indicados ao Oscar a estreias inacreditáveis, a lista segue as seguintes regras: não há separação entre papéis protagonistas e coadjuvantes e nem de gênero, tendo como critério de inclusão a estreia do filme em solo tupiniquim dentro do ano ou com o filme chegando à internet sem distribuição no país até o fechamento da lista.

Não assistiu a algum dos longas aqui listado? Não se preocupe, pode ler todos os textos que são sem spoilers - e em seguida correr para aclamar essas performances maravilhosas. Quem são os indicados ao Oscar Cinematofagia de "Melhor Atuação" do ano? Você pode conferir abaixo.


20. Guslagie Malanda, Saint Omer

A francesa Guslagie Malanda estudou para ser historiadora da arte, mas seu amor pelo Cinema e Teatro, algo cultivado desde a infância, a fez tentar a carreira de atriz. "Saint Omer" é apenas o segundo filme de Malanda, que teve a tarefa de transpor para as telas a vida de uma mulher real acusada de assassinar o próprio bebê de um ano. Não só os meandros do papel demandariam talento, mas a persona da personagem, uma mulher soterrada em uma angustiante indiferença, faz com que Malanda seja dona da posição sem que consigamos ver outra pessoa ali.


19. Zelda Samson, Amor Segundo Dalva

"O Amor Segundo Dalva" é um filme complexo por si só. Dalva é uma menina de 12 anos que se enxerga como mulher adulta graças aos anos de abusos infligindos por seu pai. E sim, Dalva é interpretada por uma criança, Zelda Samson. O cuidado da diretora Emmanuelle Nicot faz com que a pequena atriz nunca atravesse o limiar do explícito, mas Samson brilhantemente entrega tanto a inocência de Dalva infantil como a dureza de Dalva "adulta", em um papel que seria difícil até para atrizes com anos de carreira.


18. Joely Mbundu, Tori & Lokita

Os irmãos Dardennes, diretores belgas aclamados com quase 40 anos de carreira, são especialistas em dramas humanos com tom documental. Suas protagonistas, em sua maioria mulheres, são extraídas ao máximo pelos caminhos tortuosos dos roteiros, e com Joely Mbundu não seria diferente. A francesa com descendência africada é Lokita, uma adolescente imigrante na Bélgica que tenta não apenas sobreviver como não se separar do irmão de 11 anos, Tori. Mbundu atua como se não estivesse atuando e tudo aquilo fosse um real documentário, o que é assombroso para alguém em seu primeiro papel, e logo um que aponta o dedo para o racismo, xenofobia e injustiça de um continente que se pinta como perfeito.


17. Leonardo DiCaprio, Assassinos da Lua das Flores

DiCaprio já se consolidou com um grande ator há décadas, sendo indicado e vencendo todos os maiores prêmios da indústria pelo mundo. Em sua melhor performance desde "O Regresso" (2015), que lhe rendeu seu primeiro Oscar, o ator vive também uma pessoa real, Ernest Burkhart, um ex-soldado que, ao voltar para os EUA, é preso em uma teia de ambição contra os povos originários do local, donos de terras enxarcados com petróleo. Ele se apaixona por uma das mais ricas indígenas, porém, por influência do tio (e da própria arrogância), é o responsável pela queda da família da esposa em busca da sua fortuna. "Assassinos da Lua das Flores" não é um filme fácil (são TRÊS HORAS E MEIA), mas DiCaprio renova sua carteira de um dos maiores atores da nossa época sem demonstrar dificuldades.


16. Alina Khan, Joyland

Mais uma estreia histórica, Alina Khan é uma atriz paquistanesa que começou em comerciais e clipes musicais em seu país. Com "Joyland", ela se tornou a primeira mulher trans a ser protagonista em um filme no Paquistão, o que por si só foi um escândalo. O longa foi banido no país não só por Khan, mas pela temática da obra: um pai de família rompe as barreiras do conservadorismo ao se apaixonar por uma dançarina trans. Khan, essa dançarina, enfrenta com doçura e poder diversas temáticas da vivência trans engalfinhada em um país preconceituoso, quando nem mesmos os membros da classe LGBTQIAPN+ têm repertório para se relacionarem entre si.


15. Barry Keoghan, Saltburn

O ator irlandês vê um roteiro sobre um cara que fica obcecado por um homem e, ao entrar em sua família, corrói as paredes de todos até o caos se instaurar. Sua resposta é "EU FAÇO!" antes mesmo de chegar ao final. Seu personagem em "Saltburn" divide várias similaridades com seu papel em "O Sacrifício do Cervo Sagrado" (2017), porém, sem os ares fantásticos do filme de Yorgos Lanthimos, e Barry Keoghan é especialista em insanidades na tela. Seu personagem não vê limitações para conseguir o que quer e vai do perturbador ao nojento num piscar de olhos. Será se um dia Keoghan vai interpretar alguém "normal"? Veremos.


14. Kristine Kujath Thorp, Doente de Mim Mesma

Norueguesa e com farto currículo, Kristine Kujath Thorp desponta internacionalmente com "Doente de Mim Mesma", uma comédia absurda sobre uma garota que é patologicamente viciada em atenção, e vai aos limites para ser o centro das atenções não só de sua vida particular, mas de todo mundo ao redor. Thorp balanceia a loucura e tristeza do seu papel, fazendo com que sintamos pena e raiva de uma personagem hilariamente perdida. Não se surpreenda se ela for chamada por Hollywood nos próximos anos.


13. Mia Goth, Piscina Infinita

A neta mais famosa da atriz brasileira Maria Gladys está, ano após ano, demonstrando que é uma das maiores atrizes da nova geração - ela estava presente na lista de melhores atuações de 2022 e cá está novamente. Com apenas 10 anos dentro da indústria cinematográfica, ela coleciona papéis geniais, e "Piscina Infinita" é mais um acréscimo irretocável em seu currículo. No novo filme de Brandon Cronenberg, ela é uma turista que apresenta ao protagonista (vivido por Alexander Skarsgård) o submundo do exótico país em que estão passando férias, regado com crimes, mortes, luxúria e sexo. Assim como Barry Keoghan, Goth se recusa a interpretar alguém que fosse aprovado num teste psicotécnico, e a arte ganha atuações dementes e incríveis como essa de "Piscina Infinita".


12. Joaquin Phoenix, Beau Tem Medo

O recém portador de um careca dourado, Phoenix, também em 2023, interpretou Napoleon Bonaparte na nova película de Ridley Scott, mas alguém ainda aguenta cinebiografias (filmes que giram em torna da vida e história de um personagem)? Só Lydia Tár, é claro. A glória de Phoenix no ano foi ao lado de Ari Aster em "Beau Tem Medo". O épico onírico pavimenta a viagem de seu protagonista de volta para a casa da mãe após um acidente, e como esse trajeto é infestado de percalços. O Beau de Phoenix rende análises psicológicas infinitas, principalmente no âmbito do mommy issues, e o oscariado foi a escolha seminal para o sucesso do filme, o maior "amei, mas não entendi" de 2023.


11. Sophie Wilde, Fale Comigo

A australiana de apenas 25 anos é mais uma estreia com o pé na porta nesta lista. Wilde ainda iniciou sua carreira num gênero tão difícil como o terror, sendo a orquestradora de todo o pandemônio em "Fale Comigo". Como Mia, a menina que tenta superar a morte da mãe, encontra em uma mão sobrenatural a oportunidade de falar com os mortos, porém, eles nem sempre vão embora. Tudo em "Fale Comigo" é orquestrado por exímia competência, e Wilde pega na nossa mão e nos leva direto para o inferno.


10. Sandra Hüller, Anatomia de Uma Queda

Sandra Hüller está nas telonas há bastante tempo, e conseguiu nossa atenção em 2016 com o divertido "Toni Erdmann". Dali em diante, ela estava determinada a conseguir papéis ainda mais desafiadores, e encotrou o filme perfeito com "Anatomia de Uma Queda". No vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes 2023, Hüller é uma mulher que encontra o marido morto ao lado de sua casa. A questão é: aquilo foi um suicídio ou ela foi a culpada. Transitando entre a vida íntima da protagonista e sua posição no tribunal durante o processo, a alemã carrega um dos mais densos roteiros do ano ao entregar uma personagem abstrusa que é difícil de decifrar até mesmo para a plateia. A indicação ao Oscar vem aí.


9. Sadaf Asgari, Até Amanhã

É comum que diretores encontrem suas musas e parceiras de inúmeros trabalhos dentro de sua filmografia, e a musa do iraniano Ali Asgari é Sadaf Asgari. Em "Até Amanhã", vamos aos subúrbios do Irã e conhecemos Fereshteh, uma mãe solteira que deve esconder o filho dos pais que decidem aparecer em sua casa de surpresa. Na sociedade iraniana, um filme "ilegítimo" é motivo de vergonha, e Fereshteh deve encontrar um local para deixar o bebê até o dia seguinte. Asgari desempenha nuances impressionantes na pele da mãe destinada a aguentar um fardo imposto por uma sociedade sexista, resumida divinamente na cena do táxi, quando ela embarca em uma turbilhão de emoções sem soltar uma palavra. Seu rosto, no entanto, grita.


8. Maeve Jinkings, Pedágio

Maeve Jinkings faz parte do panteão do cinema brasileiro contemporâneo, atuando em algumas das maiores fitas da nossa história recente, como "O Som Ao Redor" (2013), "Boi Neon" (2016) e "Aquarius" (2016). Em "Pedágio", a brasiliense repete a parceria com Carolina Markowicz, sua esposa, depois de arrebentar em "Carvão" (2022). Agora, ela vive uma mãe suburbana que decide fazer o que for preciso para juntar dinheiro e levar o filho homossexual em um retiro de "cura gay" evangélico. Jinkings então rasga o ecrã com sua personagem ao mesmo tempo hilária e trágica, um retrato tão piamente fiel da hipocrisia gospel que está em todas as esquinas do nosso país.


7. Tobin Bell, Jogos Mortais X

Mesmo com quase 40 anos de carreira, Tobin Bell entrou para os anais do Cinema como um dos mais icônicos vilões da história do terror, o Jigsaw da franquia "Jogos Mortais". Ela, que havia anunciado seu fim em 2010, viu o potencial financeiro e quebrou sua própria promessa, contudo, ainda não tínhamos testemunhados um filme que desse a luz merecida para John Kramer. "Jogos Mortais X" veio para resolver todos os problemas. A ideia de fincar o décimo filme entre o primeiro e o segundo foi genial, e aqui vemos Kramer sendo enganado por uma equipe médica que promete curá-lo do câncer, e, pela primeira vez, mergulhamos profundamente nas motivações do personagem, que consegue encontrar pessoas piores que ele mesmo. 20 anos depois do primeiro filme, Bell ainda demonstra estar em plena forma.


6. Natalie Portman, Segredos de um Escândalo

Saindo um pouco do mundinho Marvel (tive que pesquisar se era Marvel mesmo), a vencedora do Oscar Natalie Portman retorna para mostrar que é, sim, uma das melhores no drama "Segredos de um Escândalo". Ela é Elizabeth, uma atriz que vai interpretar uma mulher que foi a estrela de um escândalo quando foi pega tendo um caso com um menor de idade - e eles permanecem juntos até hoje. Elizabeth entra na vida da família para entender melhor como performará seu papel no filme, porém, ela vai adentrando demais na rotina da família, misturando o que seria sua ficção com sua realidade. Uma cena chave é quando Portman executa um monólogo quebrando a quarta parede da plateia e de sua própria vida, em busca de uma veracidade que não importa mais a fonte.


5. Mia McKenna-Bruce, Como Fazer Sexo

Mia McKenna-Bruce trilhou sua carreira com destaque para a tevê britânica em séries infantis, o que é um constraste por si só ao assistirmos a "Como Fazer Sexo". Ela é Tara, uma jovem que viaja para a Grécia com duas amigas em busca das férias perfeitas. Lá, ela vai conhecer os prazes e dores de uma fase da vida destinada a ser crucial pelo resto dos seus dias. Com uma destreza invejável, a atriz é absoluta como a porta-voz de uma das discussões mais sérias que o Cinema pode discorrer, o consentimento sexual feminino. McKenna-Bruce é o rosto e o corpo de traumas que desembocam no público em uma obra-prima.


4. Lola Campbell, A Sucata

12 anos. Seu primeiro filme. Lola Campbell nasceu para o Cinema. Em "A Sucata" ela é Georgie, uma criança que vive sozinha após a morte da mãe, enganando o governo para que não seja realocada até um orfanato. Ela vive seus dias em uma fantasia paralela, pondo os pés na realidade quando a ausência da mãe bate à porta, até que seu pai biológico, um jovem que ela nunca viu na vida, decide também bater nessa porta. Campbell é de uma plenitude tão avassaladora como a menininha que teve que esconder sua doçura a fim de sobreviver que parece ter sido criada dentro dos teatros, sendo a maior descoberta da Sétima Arte em 2023.


3. Cate Blanchett, Tár

Lydia Tár. Agora sim, a cinebiografia da década. Sim, "Tár" pode ser chamado de "cinebiografia", mas sobre uma pessoa fictícia. Na verdade, Cate Blanchett a executa tão bem que virou um meme a existência "real" de Lydia, a maestra lésbica que é o maior nome da música clássica no mundo. Blanchett já tem dois Oscars e uma infinidade de prêmios que não cabem mais numa estante, todavia, ela se entrega como se sua vida dependesse de Lydia, não só escancarando a oscilante vida da personagem, mas também colocando os olhos na cultura do cancelamento. O que poderia ser um filme banal sobre a ascensão e a queda de um ícone é uma montanha-russa deliciosa que se deve, e muito, à atuação de Blanchett. 


2. Alyssa Sutherland, A Morte do Demônio: A Ascensão

O terror ainda é um gênero subestimado pela Academia mesmo quase um século depois do seu início - apenas SEIS atores vencendo o Oscar interpretando em um filme de terror, a última sendo Natalie Portman em "Cisne Negro", em 2011. Atuações lendárias no gênero não faltam - Toni Collette não ter sido ao menos indicada por "Hereditário" (2018) foi um crime -, mas o Cinematofagia não comete tais sacrilégios. Além de Tobin Bell e Sophie Wilde, outra gigantesca atuação do terror foi a de Alyssa Sutherland em "A Morte do Demônio: A Ascensão". Como a mãe que é possuída pelo Livro dos Mortos e tem como objetivo comer a alma de todo mundo à sua frente, Sutherland arrebenta em todas as cenas, principalmente as que está sob efeitos do capiroto. É cristalino como a australiana está se divertindo no papel endiabrado, o que torna tudo ainda mais poderoso.


1. Brendan Fraser, A Baleia

Quem não ama uma história de superação? Brendan Fraser era um dos maiores galãs e estrelas de Hollywood no início dos anos 2000, encabeçando a franquia "A Múmia" e marcando seu nome como beleza, prestígio e retorno financeiro. Tudo isso ruiu com uma sucessão de filmes ruins e bilheterias fracassas, tornando Fraser um ator esquecido. Mas, como disse, quem não ama um retorno triunfal? Esse retorno foi com "A Baleia". Todos os filmes de Darren Aronofsky têm em comum o exorcismo cinematográfico de seus protagonistas - não por acaso, vários deles foram indicados ao Oscar (Ellen Burstyn em "Réquiem Para um Sonho", 2000; Mickey Rourke em "O Lutador", 2008; e a vitória de Portman em "Cisne Negro") -, e Fraser passa pelo desafio impecavelmente. Como o um professor obeso e homossexual, Fraser encara uma batalha dificílima em um filme que é "ame ou odeie", encontrando o consenso na atuação consagrada do ator, que voltou ao alto escalação de Hollywood, vencendo seu inédito Oscar de "Melhor Ator".


***

Lista: no hype de "Jogos Mortais X", todos os filmes da franquia do pior para o melhor

Olá, você, caríssimo amante do terror. Caso você não saiba, eu sou completamente viciado na franquia "Jogos Mortais" desde o seu lançamento em 2004. Lembro de assistir ao primeiro filme com minha mãe (que, sim, permitiu esse acontecimento mesmo eu tendo menos de 18 anos na época) e como ela berrava enquanto Dr. Gordon decepava seu pé com uma serra enferrujada. Icônico.

De lá pra cá, tivemos uma timeline com sete filmes, com este, inclusive, se autointitulando como o "capítulo final" - mas é claro que a alcunha seria jogada no lixo. Não demorou para outros exemplares continuassem com o trabalho de Jigsaw, e cá estamos, nos aproximando do décimo filme, "Jogos Mortais X". Muita coisa aconteceu, muitas armadilhas entraram pra história e reviravoltas que derrubaram queixos ao redor do mundo, então, para celebrar o mais novo filhote sanguinário, vamos listar todos os nove longas já lançados, do pior para o melhor.

A lista foi baseada, além das obras como um todo, em três elementos que existem em todos os filmes; 1: cena de abertura impactante; 2: armadilhas lendárias e; 3: final com surpreendente reviravolta. Vamos ver quem fez os requisitos?


#9 Espiral: O Legado de Jogos Mortais (Spiral: From the Book of Saw), 2021

Direção de Darren Lynn Bousman.

- Cena de abertura impactante: 

- Armadilhas lendárias: ❌

- Final com surpreendente reviravolta: ❌

O último lançamento da franquia, "Espiral" teve como objetivo dar uma repaginada no que conhecíamos de "Jogos Mortais" sem deixar de ser "Jogos Mortais". A ideia original surgiu de Chris Rock (sim, o humorista e criador da série "Todo Mundo Odeia o Chris"), e a Lionsgate, produtora da série, apostou na empreitada. "Espiral" não é lá tãaao ruim enquanto filme policial, mas como "Jogos Mortais", é um desastre. Chris Rock tenta a todo custo segurar as pontas, porém, é tudo muito fraco, sem impacto e sinceramente idiota. A grande reviravolta, quando descobrirmos quem é a pessoa que está imitando os jogos de Jigsaw e matando policiais, fica escancarada no mesmo SEGUNDO que é posta na tela. A motivação está lá, a execução não - e olha que foi dirigido por Darren Lynn Bousman, que conduziu três dos originais. Ainda tem o fato de: é o único que não exibe Tobin Bell como o vilão, o que é um crime hediondo. Foi um erro tão gigantesco que o novo filme coloca Jigsaw no palco principal, como deveria.


#8 Jogos Mortais : Jigsaw (Jigsaw), 2017

Direção de Spierig Brothers.

- Cena de abertura impactante: ❌

- Armadilhas lendárias: ❌

- Final com surpreendente reviravolta: 

O filme que quebrou a promessa do fim definitivo da franquia, "Jigsaw" é uma boa tentaria de reviver a saga - tanto que estamos aqui com ela firme e forte - e que foi, acima de tudo, um fanservice. Se você já amava Billy e seus amigos, tá tudo certo, caso contrário, não há muito para você aqui. Com um elenco completamente novo, estamos há 10 anos da morte de John Kramer, contudo, corpos começam a aparecer pela cidade. Um novo jogo está acontecendo, mas quem estará por trás? "Jigsaw" carrega uma reviravolta muito engenhosa e consegue até implantar a dúvida da morte do vilão, mas não há uma mísera armadilha digna de ser mencionada e a dinâmica do jogo não faz o menor sentido. Com um novo discípulo a solta, "Jigsaw" não deve está muito satisfeito da forma como sua filosofia segue ativa.


#7 Jogos Mortais: O Final (Saw 3D), 2010

Direção de Kevin Greutert.

- Cena de abertura impactante: 

- Armadilhas lendárias: 

- Final com surpreendente reviravolta: 

Aquele que se dizia o final, "Jogos Mortais 7" carregava o peso de dar o ponto definitivo na apoteótica saga policial que começara há 16 anos, porém, mesmo com todos os elementos que nos fazem amar "Jogos Mortais" estando ali, "Jogos Mortais 7" fica aquém das sequências anteriores. O jogo central gira ao redor de um homem que ganhou sucesso mundial ao contar como sobreviveu a um dos sádicos jogos de Jigsaw, monetizando midiaticamente de todas as formas possíveis o evento. Só que, aqui está a reviravolta, ele nunca foi testado antes. Todos que faziam parte da mentira foram colocados à prova, e é facílimo imaginar alguém fingindo o mesmo caso tudo aquilo fosse real. Com a volta do Dr. Gordon e armadilhas criativas - a do anzol é genial -, é inexplicável como a produção aqui decaiu tanto - todo o sangue COR-DE-ROSA e efeitos de maquiagem são desastrosos, a fim de potencializar um desnecessário 3D - além de jogar tudo na tela da forma mais exagerada possível. É quase uma sátira.


#6 Jogos Mortais 5 (Saw V), 2008

Direção de David Hackl.

- Cena de abertura impactante: 

- Armadilhas lendárias: 

- Final com surpreendente reviravolta: 

O quinto capítulo da franquia tem elementos definitivos para carregar: Jigsaw está morto e Hoffman deve prosseguir o trabalho inacabado. O jogo principal acompanha cinco pessoas que estão conectadas de alguma forma, e cabe a eles descobrirem o porquê e, claro, se manterem vivos em quatro armadilhas assustadoras. "Jogos Mortais 5" tem tudo no lugar: já começa com a armadilha do pêndulo, impactante logo de cara, e uma boa reviravolta quando os sobreviventes do jogo descobrem que TODAS as armadilhas ali davam (e deveriam) ter sido vencidas pelos cinco, sem necessidade de alguém morrer uma mísera vez. O que faz o longa não ficar mais acima é o grupo de atores desse jogo: nenhum consegue passar a veracidade de uma situação tão extrema, com algumas performances sofríveis. Mas o que dizer da armadilha dos litros de sangue? É de arrepiar.


#5 Jogos Mortais 4 (Saw IV), 2007

Direção de Darren Lynn Bousman.

- Cena de abertura impactante: 

- Armadilhas lendárias: 

- Final com surpreendente reviravolta: 

"Jogos Mortais 4" carrega a melhor abertura de toda a franquia: começamos com uma gráfica autópsia de John Kramer, vendo todos os órgãos lindos do vilão serem retirados e, olha só, um deles carrega uma surpresa: uma fita que informa que os jogos estão só começando. O policial Rigg é a cobaia principal, e correrá pela cidade esbarrando com várias vítimas e tem apenas uma missão: chegar ao final DEPOIS de 90 minutos. É óbvio que a obsessão de Rigg em salvar todo mundo é tamanha que ele chega faltando um segundo para terminar o tempo, o que acarreta na morte de todo mundo, inclusive a dele. É aqui que temos a confirmação de que Hoffman, que passa o filme fingindo estar preso, é um dos discípulos de Jigsaw, todavia, a grande reviravolta é que "Jogos Mortais 4" se passa ao mesmo tempo que "Jogos Mortais 3", com seus finais se encontrando gloriosamente.


#4 Jogos Mortais 2 (Saw II), 2005

Direção de Darren Lynn Bousman.

- Cena de abertura impactante: 

- Armadilhas lendárias: 

- Final com surpreendente reviravolta: 

Com o sucesso de "Jogos M ortais 1", os produtores correram para jogar no mundo uma continuação. É verdade que aqui continuamos com a ideia de que "a continuação nunca é melhor que o original", mas "Jogos Mortais 2" deve bem pouco ao antecessor. A polícia descobre o paradeiro de Jigsaw e ele é facilmente preso com seu quadro de câncer em estado avançado, porém, tudo está fácil demais. É claro que Kramer não moveu um dedo de propósito, com um jogo acontecendo pelas telas na sala ao lado, e pior, o filho do policial encarregado pelo caso é uma das vítimas. As regras são claras: o detetive deve sentar o ouvir Jigsaw até que o cronômetro chegue a zero, assim, ele terá o filho são e salvo. Alguém nessa franquia ouve as regras? Parece que não. "Jogos Mortais 2" tem uma enxurrada de cenas memoráveis - a abertura com a máscara da morte, a piscina de agulhas e a chave que não deveria ser colocada na porta -, no entanto, suas DUAS reviravoltas roubam a cena: não só é revelado que Amanda é uma discípula de Jigsaw como todo o jogo nas telas não é ao vivo, e sim uma gravação de dias atrás. Mesmo com a correria para lançar uma continuação, "Jogos Mortais 2" é um exemplo de como uma franquia de terror deve ser conduzida.


#3 Jogos Mortais 6 (Saw VI), 2009

Direção de Kevin Greutert.

- Cena de abertura impactante: 

- Armadilhas lendárias: 

- Final com surpreendente reviravolta: 

A partir de agora, estamos no panteão da saga de Jigsaw, com sua santíssima trindade. "Jogos Mortais 6" mostra a que veio quando começa com uma armadilha chocante: dois agiotas devem colocar a maior quantidade de partes corporais numa balança para sobreviver. Se no filme de 2004 a gente já se chocou com Dr. Gordon cortando seu pé sendo que mal vemos o ato, aqui temos um cutelo arrancando um braço enquanto a mão está se mexendo de dor. É isso aí. O sexto filme entra no coração do sistema de saúde norte-americano, com seus planos de saúde caríssimos que estão atentos para negar qualquer tratamento - e economizar milhões para seus donos. E de quem foi o tratamento negado? Nosso paciente com câncer terminal favorito, John Kramer. Azar de todos que trabalham ali, condenados às armadilhas de Jigsaw - no caso, de Hoffman. "Jogos Mortais 6" é um saboroso exemplo de filme de terror, aquele que deixa no ar uma grossa camada de desespero, informando sem usar palavras que os personagens estão sem esperança. E a armadilha do carrossel possui, talvez, a melhor dinâmica em todos os nove filmes.


#2 Jogos Mortais 3 (Saw III), 2006

Direção de Darren Lynn Bousman.

- Cena de abertura impactante: 

- Armadilhas lendárias: 

- Final com surpreendente reviravolta: 

Como você viu, "Jogos Mortais 3" não tem uma armadilha para abrir sua duração, e o motivo é simples, resumindo o âmago do filme: ele está interessado em desenvolver meticulosamente todas as pontas que resultarão em seu final. John está em seus dias finais, e uma médica é sequestrada para garantir que ele esteja vivo até o final do jogo principal, que vê um homem encontrando os responsáveis pela morte do seu filho. Quase inteiramente focado na maca em que Jigsaw pacientemente espera a hora do seu fim, "Jogos Mortais 3" é brilhante na criação dos relacionamentos em tela, brincando diabolicamente com o espectador, que não sabe que a médica é esposa do cara no jogo principal. Quando todas as peças se encontram, a chuva de sangue, dor, medo e ódio desembocam em uma película divina.


#1 Jogos Mortais (Saw), 2004

Direção de James Wan.

- Cena de abertura impactante: 

- Armadilhas lendárias: 

- Final com surpreendente reviravolta: 

Uma certeza é que James Wan, os roteiristas e produtores de "Jogos Mortais" jamais imaginariam a proporção que seu filminho de 1 milhão de orçamento alcançaria. Um dos filmes mais lucrativos de todos os tempos veria o nascimento de uma lenda do horror, o assassino que nunca matou uma pessoa sequer. Dois homens acordam acorrentados em um banheiro que não vê uma limpeza há muito tempo. Entre eles, está o cadáver de um homem e milhares de pistas do motivo e como eles sairão dali. Não é exagero dizer que "Jogos Mortais" mudou a cultura pop e catapultou o terror para novos patamares, servindo como espelho para incontáveis filmes que tentaram repetir sua fórmula - seja na violência ou nos plot-twists -, mas ninguém jamais chegou perto do choque que foi ver o cadáver que estava ali o tempo inteiro se levantar e se revelar como o vilão. Mesmo com literalmente DUAS falas, Tobin Bell ali dava luz a um marco.

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Onde "Jogos Mortais X" entrará na lista? Com Jigsaw finalmente sendo o protagonista absoluto, estamos diante da possibilidade de finalmente termos nossa saga de volta na qualidade que merece.

"Jogos Mortais X" estreia nos cinemas na quinta-feira, 28 de setembro. Nos vemos lá e que os jogos recomecem!

Os 10 melhores filmes de 2023 (até agora)


Você piscou e metade de 2023 já passou, acredita? Agora que estamos descontando tudo o que perdemos no mundinho da Sétima Arte nos tenebrosos anos de pandemia, estamos recheados de filmes fantásticos chegando nos cinemas, então é claro que eu teria que vir aqui com meus filmes favoritos de 2023 (até agora).

Caso você já conheça o Cinematofagia, o foco aqui sempre foi e sempre será a busca por filmes que não necessariamente estejam no radar na grande indústria - principalmente quando olhamos para a distribuição brasileira, que ainda sofre com atrasos de meses em comparação com estreias internacionais, inclusive de países minúsculos. Vários longas já aclamados lá fora só chegarão aqui no segundo semestre, mas tudo bem, a lista de fim de ano virá aí.

De vencedores do Oscar a pérolas de todos os cantos do mundo, os critérios de inclusão da lista são os mesmos de todo ano: filmes com estreias em solo brasileiro em 2023 - seja cinema, streaming e afins - ou que chegaram na internet sem data de lançamento prevista, caso contrário, seria impossível montar uma lista coerente. E, também de praxe, todos os textos são livres de spoilers para não estragar sua experiência - mas caso você já tenha visto todos os 10, meu amor por você é real.

Sem mais delongas, meus 10 filmes favoritos do primeiro semestre de 2023:


10. A Morte do Demônio: A Ascensão (Evil Dead Rise)

Direção de Lee Cronin, EUA.

Em 2013, o remake de "A Morte do Demônio" prometeu ser uma das mais assustadoras obras que o Cinema já pôs os olhos. Um sabor como terror, gore e insanidade que é característica da franquia, tivemos que esperar 10 anos para uma continuação, e a espera valeu a pena. "A Morte do Demônio: A Ascensão" consegue ir além e superar o filme de 2013 quando segue uma família arruinada que encontra o último prego no caixão quando o Livro dos Mortos cai em suas mãos. São 97 minutos de puro horror e com personagens fantásticos e uma das melhores atuações do ano: Lily Sullivan como a maestrina do gore.


09. Sem Ursos (No Bears)

Direção de Jafar Panahi, Irã.

O iraniano Jafar Panahi ficou famoso com seu estilo de misturar realidade com ficção, se inserindo em seus próprios filmes como um personagem central. Em "Sem Ursos", ele usa sua própria condição política - de ser impedido de deixar o Irã - como condutor do enredo: enquanto tenta dirigir um filme ao lado da fronteira, se mete numa confusão quando vira testemunha de uma briga familiar cunhada à base de religião e tradições conservadoras. "Sem Ursos" é mais um grito contra um país repressor que fez o diretor ir parar atrás das grades por sua "propaganda contra o regime". Cinema político em seu auge. 


08. Raquel 1:1 (idem)

Direção de Mariana Bastos, Brasil.

Mais um elemento do Novíssimo Cinema Brasileiro ao colocar suas mãos em discussões sociais embaladas em premissas extremamente criativas: Raquel é uma adolescente que, após uma tragédia, se curva à religião. A questão é que, quanto mais Raquel fortalece sua fé, mais ela discorda dos preceitos escritos na Bíblia, principalmente sobre a visão submissa da mulher. Então ela decide fazer algo que chocará toda a cidade: reescrever as escrituras sagradas. "Raquel 1:1" se deita sobre "Carrie: A Estranha" (1976) e "Santa Maud" (2020) nesse conto sacro, feminista e disruptivo que une folclore, cultura e elementos de terror para colocar a plateia para pensar nos símbolos que deixam dúbio o papel de Raquel como messias de uma nova crença.


07. Tori & Lokita (idem)

Direção Luc & Jean-Pierre Dardenne, Bélgica/França.

Os irmãos Dardenne estão desde 1987 explanando diversos cosmos sociais da Bélgica, que inesperadamente são universais. Indicados NOVE vezes à Palma de Ouro no Festival de Cannes - com duas vitórias -, os belgas são aclamados pela crueza e coragem de seus filmes, e com "Tori & Lokita" não poderia ser diferente: dois imigrantes africanos tentam sobreviver na Bélgica em meio a racismo, misoginia e um sistema que está empenhado em separá-los. Com um tom documental, o longa é uma jornada dolorosa que discute a crise imigratória na Europa e como esses imigrantes são corpos sujeitos à marginalização - até serem descartáveis.


06. A Piedade (La Piedad)

Direção de Eduardo Casanova, Espanha/Argentina.

Eduardo Casanova ficou famoso mundialmente logo no seu filme de estreia, "Peles" (2017), que com toda a certeza será uma das obras mais bizarras que você verá na vida (está disponível na Netflix, aproveite). Sua segunda película, "A Piedade", estava envolta de muita curiosidade por parecer seguir os moldes que formavam o cinema "casanovadiano": personagens estranhos, cenas desconcertantes e um design de produção cor-de-rosa. Aqui, uma mãe chamada Piedade é obcecada pelo seu filho, e a relação disfuncional dos dois vai sofrer um baque com o diagnóstico de câncer do filho. É verdade que "A Piedade" não vai até aonde "Peles" vai no quesito "o que diabos é isso", porém, é um capítulo fabuloso na filmografia do espanhol, um pilar chiquérrimo (e excêntrico) do cinema queer.


05. Beau Tem Medo (Beau is Afraid)

Direção de Ari Aster, EUA.

Um dos melhores diretores da atualidade, Ari Aster tinha um problemão em mãos: conseguir manter o nível dos seus dois primeiros filmes, "Hereditário" (2018) e "Midsommar: O Mal Não Espera a Noite" (2019). O mais curioso é que, se nos dois citados, o diretor teve que entrar no maquinário da indústria e moldá-los de acordo com o gosto da A24, sua distribuidora parceira, "Beau Tem Medo" recebeu carta branca para Ari despirocar e fazer o que diabos quisesse. O resultado? Um pesadelo satírico como nenhum outro. Sob o comando do vencedor do Oscar Joaquin Phoenix, "Beau Tem Medo" são 3h de insanidade que segue Beau em uma epopeia para chegar na casa da mãe após um acidente. Com sequências alucinógenas, cenas sem o menor sentido aparente e plot-twists incalculáveis, você passará dias tentando montar o quebra-cabeças do "mommy issues" do ano - e olha que acabamos de falar de "A Piedade". 

 

04. Até Amanhã (Until Tomorrow)

Direção de Ali Asgari, Irã/Catar.

Fereshteh é uma mãe solteira no coração do Irã, um escândalo por si só. Ela esconde a criança de todo mundo, com apenas duas pessoas sabendo da existência da filha: Atefeh, sua melhor amiga; e Yaser, o pai da criança que não tem o menor interesse em assumir o papel. Fereshteh segue bem com a vida, mediante a situação, mas tudo parece que está por um fio quando sua família informa que fará uma visita surpresa. Ela então corre pela cidade, à procura de alguém que poderá ficar com a menina por apenas uma noite. "Até Amanhã" é um drama impecável que estuda a vulnerabilidade da mulher num país que pinta um filho "ilegítimo" como desonra absoluta. Cada minuto que passa, mais o público se aflige com a situação de Fereshteh, que entrega uma das mais fantásticas cenas do ano - a do táxi. 

 

03. Tár (idem)

Direção de Todd Field, EUA/Alemanha.

Lydia Tár é uma maestrina de absurdo sucesso e conduz uma das melhores orquestras do mundo. Por trás de todo o glamour de sua abarrotada agenda, Lydia deve lidar com o casamento ameaçado, sua carreira em corda bamba e fake news sobre seu caráter. "Tár" tem quase 3h, em um robusto filme que está para a música clássica como "Cisne Negro" (2010) está para o balé e "Demônio de Neon" (2016) está para a moda, estudando as percepções de estrelas na mídia e a ascensão e queda de ídolos. Se o texto consegue carregar tantos temas complexos com maestria (bah dum tss), é a atuação lendária de Cate Blanchett que eleva a sessão a um patamar de obra-prima e que fará "Tár" ser lembrado por toda a história.


02. Morte Infinita (Infinity Pool)

Direção de Brandon Cronenberg, Canadá/Croácia.

Em 2022, David Cronenberg - um dos pais do horror norte-americano - voltou à velha forma com o incrível "Crimes do Futuro"; em 2023, é a vez do seu filho. Brandon Cronenberg prova que é um pupilo exemplar do Cinema de seu pai ao lançar "Morte Infinita": um rico casal está em luxuoso resort e verá suas férias (e suas vidas) pegarem um caminho monstruoso ao conhecer outro casal veterano. Ao causarem um acidente, os ricaços descobrem uma das leis do país: assassinato é pago com a morte do culpado pelas mãos da família da vítima, todavia, quem tem dinheiro tem uma saída, e no universo fílmico de "Morte Infinita" há um segredo macabro. Alexander Skarsgård e Mia Goth (que diz "SIM!" para qualquer roteiro que a descreve como "personagem psicótica") dão vida (e morte) para um roteiro narcotizante que possui cada vez mais camadas quanto mais você reflete sobre. O último pilar da "Santíssima Trindade do Transhumanismo Contemporâneo", ao lado de "Crimes do Futuro" e "Titânio" (2021). Amém.

 

01. A Baleia (The Whale) 

Direção de Darren Aronofsky, EUA.

Um dos longos mais polêmicos de 2023 - o que não é raridade dentro da carreira de Aronofsky, "A Baleia" conseguiu abocanhar dois Oscars e marcar o retorno triunfal de Brendan Fraser, que levou o careca de "Melhor Ator" ao viver um professor obeso em seus últimos dias de vida. A carga dramática de "A Baleia" engalfinha por um peso emocional raro - curiosamente, mesmo com toda a dor do texto, o filme possui o final mais esperançoso de toda a filmografia de Aronofsky, no entanto, chegar até lá é uma tortuosa viagem que com certeza não agradará a todos. A cereja do bolo que refletiu o status de obra-prima para "A Baleia" veio quando, na cena final, em uma revelação que amarra toda a história, uma pessoa sentada ao meu lado na sessão levou as duas mãos ao rosto em completo frenesi. É a beleza da tristeza e a feiura da alegria em um dos mais arrebatadores finais da década, que arrancaram minhas lágrimas como nunca antes diante da Sétima Arte.

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