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Conheça Lina Wertmuller, a primeira mulher indicada ao Oscar de Melhor Direção

Lina Wertmuller. Jane Campion. Sofia Coppola. Kathryn Bigelow. Greta Gerwig. Essas são as únicas cinco mulheres indicadas ao Oscar de Melhor Direção em 90 anos de premiação, e apenas uma delas, Bigelow, levou o prêmio por "Guerra ao Terror" (2009). A Academia, muito conservadora desde sempre, ainda demora a reconhecer mulheres em suas indicações, o que diretamente contribuí para a dificuldade delas entrarem nesse meio e se destacarem.

Wertmuller foi a primeira mulher a ser indicada na categoria por “Pasqualino Sete Belezas” (1975). De origem italiana e suíça, a diretora vem de uma família de nobres e desde cedo se mostrou como a rebelde da família. Foi expulsa de diversos colégios católicos e estudou teatro em uma época que mulheres nem mesmo deviam ir à faculdade, quanto mais serem atrizes.

Seu contato com artistas a levou para o mundo do cinema, onde trabalhou como roteirista e assistente de direção. Seu grande momento aconteceu na oportunidade de trabalhar com Federico Fellini, um dos maiores cineastas italianos, responsável por “8 ½”. A contribuição nesse filme deu forças para a realização de sua primeira obra autoral, “Os Inativos” (1963).

O mafioso boa lábia Pasqualino (Giancarlo Giannini)

A diretora é uma comunista assumida e, em um território mais fértil para suas ideias de independência, feministas e pró-anarquistas, longe do conservadorismo de Hollywood, aflorou uma obra sarcástica, crítica e muitas vezes atemporal. A indicação de 1976 aconteceu após uma série de filmes que chamaram atenção internacionalmente como “Ferido na Honra”, “Amor e Anarquia” e “Tudo a Postos”.

“Pasqualino Sete Belezas”, que a garantiu a indicação, foi ovacionado por sua combinação perfeita entre drama e comédia. O filme aborda o típico macho italiano que Lina adorava desconstruir em seus filmes, que mata um cara para defender a honra de suas irmãs e acaba num manicômio. Com a ajuda de uma médica, vai parar no exército de combate da Segunda Guerra Mundial, mas malandro e mafioso que é, deserta e acaba preso em um campo de concentração nazista, onde é capaz de fazer tudo para sobreviver. A abertura do filme por si só é uma obra prima, veja: 



A história com Lina, contudo, não foram só flores. Não foi a primeira mulher diretora, é claro, mas como umas das pioneiras sofreu pressões que homens jamais passariam. Alguns deslizes e êxitos menores no cinema a fizerem rapidamente perder relevância, e é lembrada principalmente por suas obras nos anos 1970, por mais que tenha continuado a filmar até 2004, quando se aposentou da direção. 

Além das cinco indicadas em Melhor Direção, há tantas outras que são tão maravilhosas quanto e você precisa conferir suas obras. Recomendamos, Ava DuVernay ("Selma"), Valerie Faris ("Pequena Miss Sunshine"), Barbra Streisand ("Yentl"), Lone Scherfig ("Um Dia") e Lisa Cholodenko ("Minhas Mãe e Meu Pai"). Ah!, Feliz Dia Internacional da Mulher! ♥

Homens continuam a escrever personagens femininas e a ganhar prêmios com elas

Esse ano três mulheres foram indicadas ao prêmio Emmy de Melhor Direção em Série Dramática: Reed Morano e Kate Dennis por “The Handmaid’s Tale” e Lesli Linka Glatter por “Homeland”. Desde 2010, não temos tantas mulheres na principal categoria de direção, e desde 1995 (Mimi Leder por “Plantão Médico”) uma mulher não ganha na categoria. Em 2017, as mulheres são favoritas ao prêmio, mas isso realmente representa um avanço?

A princípio esse dado pode parecer uma grande mudança para as mulheres como um todo e, em especial, para as que atuam ou querem atuar no meio audiovisual. Realmente é ótimo que meninas possam enxergar mulheres em cargos criativos e de liderança, inspirando-se a enfrentar barreiras nesse caminho. Contudo, há 22 anos uma mulher não ganha o Emmy de Melhor Direção e, olhando para as outras categorias, como Melhor Roteiro em Série Dramática, Melhor Direção em Série Cômica e Melhor Roteiro e Melhor Direção em minissérie, os homens continuam a dominar, e o pior – escrevendo personagens femininas.

“Feud: Bette e Joan”, da FX, série que explora a rixa entre as duas atrizes foi escrita, produzida e dirigida majoritariamente por homens.

Muitas das obras indicadas nas categorias acima contam com mulheres como protagonistas, é o caso de “Feud: Bette and Joan”, “Big Little Lies” e “Veep”, ou até mesmo como coadjuvantes, como é o caso de “Fargo” e “Master of None”, mas não são mulheres que constroem esses personagens e, em sua maioria, as dirigem. Homens continuam dominando a indústria, e pequenos avanços muitas vezes são recebidos com mais euforia do que deveriam, porque na verdade demonstram o abismo entre os gêneros no audiovisual. Além disso, produtores e showrunners, aqueles que de fato comandam a produção de uma série, são em sua maioria homens, e isso impacta diretamente na contratação de profissionais mulheres nos sets de gravação, sobretudo em posições de liderança, como diretoras e roteiristas. Só nessas posições que mulheres podem escrever e dirigir outras mulheres, deixando de lado assim personagens muitas vezes caricatas e longe da realidade. Mesmo quando são mulheres fortes e pouco “criticáveis”, é importante que elas mesmas falem sobre seus problemas em primeira pessoa, não?

“Orange Is The New Black” é um dos poucos exemplos de séries onde há muitas mulheres em cargos de liderança. 
É o caso de séries como “Orange Is The New Black” da Netflix, onde as produtoras são mulheres, e a maioria da direção e roteirização também é feita por mulheres, o que tornou a produção original do serviço uma referência em personagens femininas complexas e bem construídas. Não só tratar homens e mulheres como iguais nas séries, é necessário ações concretas para que ambos possam competir saudavelmente em seus ramos, e que as mulheres deixem de ser minoria na maioria das produções.

Vamos aguardar o Emmy 2017, que acontece no próximo mês, torcendo pelas profissionais concorrendo nas principais categorias, sem esquecer, é claro, de fazer nossa crítica à indústria atual, que não pode receber descanso da sociedade na pressão de tornar o meio mais igualitário. 

MC Carol, Karol Conka, Solange e uma conversa sobre o feminismo negro

Na última quinta-feira (6), MC Carol e Karol Conka se declararam “100% feminista”! Se você ainda precisava ter certeza, é porque não conhece muito bem a carreira ou a trajetória de vida dessas mulheres incríveis. Ambas são mulheres negras, que saíram do subúrbio de suas cidades – Carol é de Niterói e Conka, de Curitiba – e resolveram soltar a voz no funk e no rap, de longe os meios mais machistas da cena musical brasileira. Essas mulheres poderosas não são de poucas ideias: suas músicas vêm cada vez mais carregadas de discursos políticos, principalmente sobre pautas como feminismo e negritude.

Carol Bandida sempre teve postura de mulher independente, que não leva desaforo para casa e não se rebaixa diante de ninguém. Inclusive faz seu namorado, que é o maior otário, lavar suas calcinhas. Deixa muito claro para o mundo que é linda e gostosa, grita aos quatro ventos se for preciso e ninguém a convencerá do contrário. O discurso feminista é nítido! Apesar de que, para as mulheres negras periféricas, essa é a realidade diária de suas vidas: não é só uma nomenclatura, mas uma necessidade vital de sobrevivência.

Em suas últimas músicas, Carol tem deixado um pouco de lado o tom debochado para dar espaço para a revolta com uma sociedade racista, machista, elitista e excludente. Em “Não Foi Cabral”, ela pede desculpas a professora e dispara a verdade sobre a história do Descobrimento do Brasil, que não foi pacífica e bonita como nos é ensinado na escola, mas marcada pelo sangue, medo e o saqueamento completo das terras, riquezas e culturas dos índios.

Já em “Delação Premiada” (que, como “100% Feminista”, quem assina a produção é o Leo Justi) o assunto é a disparidade violenta no tratamento da polícia, que tem uma cartela de cor e classe para classificar quem é bandido – muitas vezes sem sequer perguntar –, além de relembrar muitos casos sem solução que cada vez mais aumentam a lista dessa instituição truculenta e genocida. Agora em “100% Feminista”, em parceria com a Karol Conka, ouvimos sobre a violência contra a mulher e a misoginia, que nos fere fisicamente e psicologicamente, inviabiliza, invisibiliza, machuca, aprisiona e mata mulheres todos os dias ao redor do mundo.



Karol Conka rouba a cena com seu jeito despojado, seu estilo ousado e o cabelo rosa que é sua marca registrada. Começou se apresentando no circuito do hip hop curitibano e foi conquistando seu espaço no mainstream até conhecer o produtor Nave, que deu um empurrão produzindo seus primeiros trabalhos e depois seu álbum “Batuk Freak” (2013), de forma independente. Ganhou de vez a atenção dos holofotes quando assinou o selo Buuum da Skol Music e lançou os singles “Tombei” (2015) e “É o Poder” (2016), com produção da dupla Tropkillaz. Em seus trabalhos sempre deixou claro que o lugar da mulher é onde ela quiser! Nessa nova música, MC Carol e Karol Conka se colocam enquanto mulheres negras, de “cabelo duro”. Fortes, porém frágeis; independentes e destemidas.

Fica impossível não se conectar automaticamente com outra mulher negra e ouvir, em meio ao batuque do samba e os riffs de guitarra, a ameaça empoderada da denúncia de uma violência doméstica: “Você vai se arrepender de levantar a mão para mim”. Ela mesma, A Mulher do Fim do Mundo, Elza Soares. Um dos nomes dentre os muitos mencionados na parceria feminista das negras que levam o mesmo nome. Anote e mergulhe nas pesquisas: Aqualtune e Dandara dos Palmares, líderes quilombolas na luta contra a escravização da população negra; Carolina Maria de Jesus, uma das primeiras escritoras negras da história do Brasil; para mencionar algumas mulheres ilustres que são imprescindíveis para o movimento feminista negro. Voltando para o mundo da música, tivemos Nina Simone, cantora, compositora e ativista pelos direitos civis dos negros norte-americanos; a voz da inquietação de quem sofre na pele com o racismo e suas mazelas.



Ao longo dos anos, muitas mulheres perseveraram para que a voz do feminismo negro não fosse silenciada. Atualmente, o movimento vem lutando para manter acesa a fresta de luz que vem conquistando com muita garra, insistência e afrontamento. E que instrumento melhor que a música para ecoar nosso grito de resistência ainda mais forte? Um dos últimos lançamentos internacionais que abordou o assunto com perfeição foi o álbum “A Seat at the Table”, da Solange. De uma forma precisa e até divinal, o último disco dessa garota do Texas multifacetada é o pacote completo: uma sonoridade musical absurdamente apaixonante, com participações de nomes de peso – como Lil Wayne, The Dream, Kelly Rowland e Kelela – combinadas às mensagens profundas de empoderamento negro. Solange diz que “você tem todo o direito de estar bravo" com o racismo e avisa para os outros “não tocarem em seu cabelo” afro. Ela não fica à sombra da irmã, Beyoncé! Tem seu brilho próprio, que de tão grande, pode até ofuscar alguns olhares preconceituosos. Lastimável que seu trabalho não foi reconhecido nem ovacionado da mesma maneira como foi, e ainda é, o Lemonade.



Já em terras tupiniquins, não podemos deixar de falar do trabalho brilhante da Tássia Reis em seu último disco “Outra Esfera”. De Jacareí para o mundo, é perceptível que a rapper se despiu de toda timidez e veio escancarar tudo que andava engasgado na garganta. “Ouça-me” é um pé na porta do silenciamento sofrido pelas mulheres negras e o grito da ancestralidade de quem nunca mais vai se calar. Ela avisa: “A revolução será crespa, (...) não podem conter”. Em “Da Lama / Afrontamento”, com a rapper Stefanie, ao ouvir chega a ser possível enxergar a imagem da desigualdade da vida na periferia e que a realidade das pessoas negras é uma tentativa constante de nadar contra a maré. É maravilhoso como tanto o trabalho da Karol Conká e da MC Carol quanto o da Tássia Reis são capazes de atingir desde o povo da periferia até uma parcela da população que desfruta de muitos privilégios – mas se desconstrói (diariamente) para ser consciente – com o mesmo diálogo.


Sabemos que ainda há muita resistência dessa sociedade racista e machista, mas a resistência do povo negro é de uma ancestralidade muito cheia de força. Seguimos, nem um passo atrás! E para isso, enaltecemos o trabalho das tantas mulheres negras formidáveis que existem mundo afora; seja na música, na televisão, na academia ou em qualquer outro espaço dos quais nos são negados. Viva, Janelle Monae! Viva, Djamila Ribeiro! Viva, Preta Rara! Viva, Jéssica Ellen! Viva, Luana Hansen! Viva, Andreza Delgado!

Um viva à todas as mulheres negras que existem e resistem! <3

De mulher para mulher: uma conversa sobre a paródia de “Work”, da Kéfera

Kéfera, senta aqui. Vamos conversar! De mulher para mulher, como diz aquela cartilha da sororidade que mulheres brancas sempre tentam usar contra nós quando falamos sobre racismo – aquele papo chato de situações que elas não vivenciam e insistem em minimizar e nos silenciar. Afinal, somos todas mulheres, não? Mas quando são as pretas que sentem, elas não querem estender a mão e dividir conosco a nossa dor.

Ser vlogueira não deve ser fácil. Todo mundo se sente no direito de opinar sobre a sua vida, sobre sua aparência, sobre o que você faz ou deixa de fazer. Mas deixa eu te contar um segredo? Assim, como uma daquelas "confidências femininas": se no seu lugar, fosse uma mulher negra, dificilmente ela teria esse lugar ao sol que você tanto desfruta. Ela não teria as mesmas oportunidades, por mais que continuem a insistir nessa ideia errônea de igualdade racial – já que somos o país da miscigenação. Por aqui, também existe um mito de que somos mulheres livres e fogosas, cheias de desejo. Mas vamos voltar a falar sobre oportunidades: você já teve tantas! Além do vlog, escreve livros, dá pinta de atriz e comediante. Sem esquecer de mencionar as tantas oportunidades de errar e ser perdoada, que você parece não fazer a mínima questão. E claro, nessa postura de quem não está nem aí, vai lá e ataca outra vez.

Mas a gente já cansou, sabe Kéfera? Vou te contar por que: você chega se apropriando da música de uma mulher negra para fazer uma paródia. Inclusive, falando sobre apropriação, sugiro uma leitura atenciosa sobre algo que estamos pontuando há um tempo: apropriação cultural. Aquela velha história de "amamos a cultura negra, mas não os negros"? Então... Mas isso é assunto para outro momento. Vamos focar nessa linha de raciocínio: você decide fazer uma paródia de "Work", da Rihanna, que está no topo das paradas de sucesso há semanas. Afinal, quando brancos não quiseram fazer fama em cima de artistas negros? Clarice Falcão também já errou nessa, quando tentou fazer sua versão água-com-açúcar-ukulele-feminismo-branco de "Survivor", obra das negras do Destiny Child. Nada de novo sob o sol. Em cima da letra dançante de "Work", você tenta emplacar a ideia de que, quando um homem pisa na bola em um relacionamento, deve se redimir com flores e joias. Mas é claro que é só isso que mulheres querem, não é mesmo? Um relacionamento sadio, baseado em diálogo maduro e sinceridade não passa de balela. Sem deixar de mencionar o quanto é incentivada a postura de que, numa relação, o casal deve monitorar tudo o que o outro faz nas redes sociais. Respeito à individualidade pra quê? Em um relacionamento sério e monogâmico – que significa um acordo mútuo feito entre as duas partes da relação – se esse acordo não é respeitado, a culpa não é da "biscate" que mandou mensagem para o seu namorado; a culpa é dele em corresponder. Passamos a vida toda aprendendo a enxergar outras mulheres como inimigas, que representam perigo aos nossos relacionamentos. Sabe qual é a cura para isso? Feminismo!

"Recebeu no snap um nude com teta. Acho melhor responder minha mensagem, ou então te aviso, a coisa vai ficar preta." Deixa eu te dizer uma coisa, Kéfera? O termo "a coisa tá preta" tem cunho racista. Por que o que é preto sempre é visto como algo ruim? Saiba de uma coisa, monamú: quando uma coisa "tá preta", ela tem tudo para ser maravilhosa! E falando em racismo, existe outro conceito que você deveria se atentar: blackface. Essa prática teatral, que surgiu no século 19, consistia em atores se pintarem com carvão para representar personagens negros de forma caricata e estereotipada. Muito próxima à imitação que seu namorado, Gusta, fez da representação do Drake em sua paródia. Aliás, vamos falar sobre a paródia feita no trecho do Drake? "Vamos conversar um pouco? Não quero virar o jogo, mas você exagerou (...) Confia em mim e não dá piti á toa". Engraçado como as mulheres sempre estão exagerando e dando piti, não? Não. Não mesmo! Isso se chama gaslighting: uma forma de manipulação e abuso psicológico/emocional no qual informações são distorcidas, seletivamente omitidas ou simplesmente inventadas com a intenção de fazer a vítima duvidar de sua própria memória, percepção e sanidade. Que mulher já não se pegou pensando que estivesse exagerando ou inventando motivos para brigar durante uma discussão com o namorado? O gaslighting é mais uma das formas com as quais as mulheres são massacradas com o machismo todos os dias e, sendo algo tão naturalizado nessa sociedade patriarcal, termina sendo reproduzido até mesmo por nós, como neste caso.


É, Kéfera... Nessa tentativa em te explicar por a + b, como 2 e 2 são 4, numa aulinha de alfabetização de primário, a sucessão de erros que é essa sua paródia nada engraçada, mais uma vez é apontado a forma com que a internet tem sido palco para vários idiotas. Machismo e racismo, mesmo que indiretamente, não são pautas para serem feitas de paródia ou piada de stand up comedy. Reconhecer o erro é o primeiro passo, mas insistir nele é burrice.

Editorial: como Karol Conká tombou com o machismo na música (e no clipe) de 'Tombei'

É evidente que o pop não é o estilo musical predominante no país - é só olharmos para a Brasil Hot 100, parada da Billboard brasileira (sim, ela existe) para notarmos o quão restrito é o pop por lá, com o sertanejo dominando. Mas nós, amantes do estilo, sempre ficamos de olhos nos expoentes do gênero nas terras tupiniquins e sabemos como somos carentes nesse departamento. De vez em quando surge algum fenômeno para termos fé no cenário, mas só de vez em quando.

Editorial: para Anitta, 'se a mulher não se respeitar, ninguém vai respeitá-la', mas o que isso muda na nossa vida?

Muito se falou nessa semana sobre o tal "Pitty X Anitta" que rolou no programa "Altas Horas". Antes mesmo se sua exibição ontem (6) a mídia já havia armado o circo da tal briga das duas. Nós do It Pop sempre tratamos de vários assuntos com humor e leveza, mas de vez em quando é bom fomentar uma discussão mais séria. Desculpe o incômodo.

Miley Cyrus e a onda machista após sua polêmica performance no VMA 2013.


Se você respira e tem acesso à um computador com internet ou somente à televisão, certamente ouviu ou leu algo sobre a apresentação de Miley Cyrus durante o Video Music Awards 2013 com seu smash hit "We Can't Stop", seguida de uma colaboração surpresa com Robin Thicke e sua grandiosa "Blurred Lines". A dança, o figurino, a atitude no palco e seu visual fizeram parte de um conjunto de fatores que chocaram a audiência do show da MTV - para exemplificar esta afirmação, a polêmica foi tanta que Miley teve sua aparição no VMA entre os assuntos mais comentados no twitter e bateu o recorde de mensagens por minuto, que antes pertencia à Beyoncé com seu show no Super Bowl.



Ontem, 3, um importante jornal brasileiro publicou uma nota em sua página do facebook sobre as declarações de Miley Cyus acerca desta tão comentada performance. O blogueiro que vos fala acompanhou a discussão e, em determinado momento, chegou a participar do debate. A maioria dos comentários eram pejorativos, alguns até ofensivos demais, chamando a ex-estrela da Disney de "vagabunda" e outros nomes que acompanham o nível de vocabulário do citado anteriormente.

Antes de tudo, esclareço que simpatizo com o trabalho da cantora, mas não sou fã, e muito menos admirei sua apresentação no VMA - pelo contrário, achei que Miley pecou pelos excessos e criou uma estratégia desesperada para enterrar seu passado. Seu grito acabou ecoando além do necessário e acabou desvalorizando o próprio brilhantismo de seu lead single. Mas isso não justifica a interpretação pré-fabricada de uma grande parcela da sociedade que enaltece homens (rappers e cantores, na indústria musical) cercados de mulheres seminuas, videoclipes masculinos cheios de orgias com diversas mulheres e composições que chegam a ridicularizar a figura feminina e, em alguns casos, ainda pregam a soberania masculina, principalmente quando consideram positiva a poligamia do homem.


Por que a crítica tão feroz à Miley quando existem tantos outros artistas que fazem o mesmo? Por que ela começou sua carreira como uma estrela do público adolescente? Independente da resposta, não é responsabilidade da cantora a educação dos jovens do mundo todo e ela não pode focar sua vida e sua carreira em tal finalidade. E mais, alguém critica a postura de algum homem com a mesma conduta em suas performances ou videoclipes? Raro. Mas a mulher não pode usar a sexualidade como aliada e não é de hoje que isso acontece - Christina Aguilera , Madonna e Janet Jackson estão aí para provar isso.


No final das contas, um aspecto positivo que resultou da performance de Miley foi trazer à tona um debate ainda necessário na sociedade contemporânea, que, muitas vezes, apropria-se de um discurso que molda um gênero, desde sua postura e sua autonomia, e vai além dos padrões de comportamento, limitando a liberdade feminina. Ela conseguiu algo sólido com essa transformação? Não sabemos, isso depende do objetivo da cantora. Mas com toda essa polêmica, Cyrus conquistou um lugar de destaque na mídia internacional, mantém posições louváveis nas paradas do mundo todo, além de ter ofuscado as outras apresentações do VMA. Talvez Miley não queira ser levada à serio, e é mais provável ainda que sua atual fase seja um reflexo de uma artista que ficou presa criativamente durante muito tempo. E ela ainda busca sua identidade, é só notar a diferença entre sua imagem no começo da divulgação de "We Can't Stop", com um visual elegante, e a Miley que vimos na premiação americana. A loira, na realidade, precisa parar de lutar contra o passado, pois com esta briga ela acaba cada vez mais presa à ele.

Em uma discussão que permite tantas diretrizes, a atual fase de Miley Cyrus não é marcada pela música em si, e sim pela publicidade da coisa, pela polêmica e pelo marketing, o que é uma pena. Se os fãs da cultura pop tentassem ao menos apreciar a qualidade sonora do novo trabalho da cantora, talvez a verdadeira música falasse por si só. E se essa rebeldia toda, em algum nível, incomoda, é porque a sociedade tem feridas abertas e ainda preferem apontar o dedo para o que é diferente, aquilo que não está dentro do círculo de bons costumes traçados pelo falso moralismo. 

Afinal, quantos homens frequentam baladas em busca de uma mulher sem problemas com seus desejos e com a própria sexualidade? Muitos, mas na hora de criticá-las são os primeiros a jogar a pedra. Machões, heim? Mas provavelmente o problema é da ex-Hannah Montana e de sua música, e não de uma herença cultural que pouco é questionada.


Sem mais, vamos conferir uma versão diferente do hit "Blurred Lines", na qual três estudantes da Nova Zelândia decidiram fazer algumas alterações interessantes:

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